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terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Israel amplia violência histórica contra palestinos

Publicado em Brasil de Fato

O Brasil de Fato publica uma série de oito reportagens sobre o crescente e histórico avanço de Israel sobre a Palestina; nesta primeira reportagem, uma visão panorâmica acerca da atual conjuntura na região

José Coutinho Júnior

enviado à Palestina
“Essa estrada leva a uma área ‘A’, controlada pela Autoridade Nacional Palestina (ANP). A entrada de cidadãos israelenses é proibida. Há perigo para suas vidas e afronta a lei de Israel”. O aviso, impresso em uma placa vermelha em todas as fronteiras entre Israel e as áreas controladas por palestinos, dá o tom da realidade no Oriente Médio.
Para Israel, há um inimigo perigoso do outro lado da linha e, por isso, a necessidade de se manter uma ostensiva militarização. Sob a perspectiva dos palestinos, a situação é diferente: para eles, a ocupação israelense é um projeto de colonização que pretende expulsar os árabes de sua terra. Prova disto é o fato de Israel já ter anexado boa parte de todo território da Palestina.
Em 1948, resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) determinou que 51% do território fossem destinados para a criação de Israel. Hoje, 78% das terras palestinas estão sob domínio israelense, restando como território palestino somente a Cisjordânia e a Faixa de Gaza. E até mesmo na Cisjordânia, território supostamente governado pela ANP, as mais de 120 colônias israelenses ocupam 88% de todo o território.

Terceira maior potência militar do mundo e apoiado pelos Estados Unidos, Israel exerce um controle sobre a sociedade palestina, não restritamente ao âmbito militar.
A violência do exército é constante: a todo momento homens e até crianças consideradas “subversivas por resistir à ocupação” são presos.
Bairros palestinos têm suas casas demolidas todos os dias. A maioria das fontes de água está nas mãos de Israel, que libera seu uso para os agricultores israelenses, mas as proíbem aos palestinos.
Os camponeses palestinos estão cercados por colônias e bases militares israelenses, que pressionam por meio da violência física e de bloqueios comerciais os camponeses a saírem de suas terras. Diversas vilas têm sido destruídas e a população expulsa, gerando um grande contingente de refugiados palestinos.
Intifadas
Os efeitos da ocupação israelense, inevitavelmente, causaram reações explosivas por parte dos palestinos. A primeira intifada – “revolta” em árabe – começou em 1987 e durou até 1993. A população saía às ruas diariamente, enfrentando soldados e tanques de guerra com pedras.
Estima-se que mais de 4 mil palestinos tenham sido mortos nesse período. Em 1995, numa tentativa de cessar os conflitos, as negociações de paz entre Israel e Palestina, com a supervisão dos EUA, começaram.
O resultado foram os Acordos de Oslo, que determinaram diversos pontos para que se alcançasse a paz, como a criação da ANP, governo que deveria representar os interesses do povo palestino; a divisão da Cisjordânia em áreas A (controle total pela Autoridade Palestina), B (controle civil pela Autoridade palestina e controle militar pelo Exército de Israel) e C (controle total pelo Governo de Israel); e a retirada das tropas israelenses da Cisjordânia e Faixa de Gaza.
20 anos depois, os Acordos de Oslo não obtiveram resultados concretos. Além da recusa israelense em retirar suas tropas do território palestino, o acordo não tocou em pontos necessários para se resolver de fato os conflitos, como o fim das colônias israelenses na Cisjordânia ou a volta dos refugiados palestinos para suas vilas de origem.
Esse fracasso fez surgir uma nova intifada em 2000, que durou até 2005. Estima-se que mais de 7 mil palestinos tenham morrido. Partidos de caráter religioso, como o islâmico Hamas, começaram a ganhar popularidade, ganhando as eleições para governar a Faixa de Gaza.
Muro da vergonha
Em 2002, Israel iniciou a construção de um muro para se separar da Palestina. Chamado pelos palestinos de “muro da vergonha”, a sua função não é apenas dividir as áreas de fronteiras. O muro, na maioria das áreas em que foi construído, vai além da chamada linha verde, que é a fronteira reconhecida entre Israel e Palestina.
Com isso, Israel confisca muitas terras de camponeses palestinos, além de controlar a movimentação da população de cidades e vilas. Essa restrição da liberdade de ir e vir impede os palestinos de ter acesso a hospitais, água, ou, no caso dos camponeses, a sua própria terra.
Dados da União dos Comitês de Trabalhadores Agrários da Palestina (UAWC) estimam que 490 mil palestinos em 92 comunidades são diretamente afetados pela construção do muro. Informam ainda que 47% da terra na Cisjordânia será confiscada e que 33 mil palestinos irão viver sob o controle direto de Israel.
Além disso, a barreira criou mais de 500 check points – postos de controle de Israel – por todo o território. Esses portões, espalhados por toda a Cisjordânia, são a única forma de passar dos territórios palestinos para os israelenses.
O processo é humilhante. A pé, é preciso passar por um detector de metais, colocar bolsas e malas em uma máquina de raio-x e um guarda verifica os documentos da pessoa.
Nos check points das estradas, guardas armados com metralhadoras, geralmente dois, param e entram no veículo, conferindo documentos de todos.
Os turistas não costumam ter problemas para atravessá-los, mas os palestinos precisam de uma boa justificativa para poder passar.
Para um palestino atravessar os check points que levam a Jerusalém, a parte israelense da cidade de Hebron, o Vale do Jordão ou áreas próximas às colônias, é necessário uma permissão das autoridades israelenses, como um visto de trabalho.
Há muitos palestinos que moram a poucos minutos de distância de Jerusalém, mas não podem visitar os locais sagrados, pois por terem sido presos pelo exército, têm a permissão negada. Muitos palestinos se concentram nos check points toda madrugada para se dirigir às cidades israelenses e poder trabalhar.
Um dos mais de 500 check points (postos de controle) espalhados pela Cisjordânia. Foto: Brigada Gassan Kanafani
“Caldeirão”
O processo de negociações entre Israel e a ANP está parado, pois Israel anunciou um plano de construção de 20 mil casas nas colônias, sinalizando que não pretende retirar as colônias do território palestino.
Por conta da forte presença israelense em territórios que deveriam ser palestinos, a proposta de dois Estados é criticada pela população e organizações da esquerda palestina, que defendem a criação de um Estado único, laico, que respeite e dê igualdade de direitos a todos os cidadãos, não importando sua religião ou etnia.
“A ANP quer retomar as negociações na esperança de cumprir os acordos de Oslo. Somos contra esse processo. Fazemos manifestações contra o governo, pois grande parte da população palestina sabe que essa solução não vai resolver”, afirmou Khalida Jarrar ao Brasil de Fato, deputada eleita pela Frente Popular pela Libertação da Palestina (FPLP).
Ao caminhar pelas grandes cidades palestinas, um turista desavisado pode achar que não há mais nenhum tipo de conflito. A vida das pessoas segue normalmente, sem que haja demonstrações explícitas da violência de Israel.
No entanto, a construção do muro continua, o exército prende e agride pessoas diariamente e os palestinos continuam precisando ter uma ficha limpa e bons motivos para entrar em Israel.
“As coisas parecem pacíficas agora, mas isso aqui é um caldeirão que vai explodir. Pode ser amanhã, semana que vem ou daqui um ano, mas vai chegar um ponto em que o povo não vai agüentar mais todos esses abusos. A situação em Jerusalém, Cisjordânia e Gaza está fervendo. Não vai demorar muito até acontecer outra revolta popular”, avisa Samarh Darwish, diretora da UAWC.
Foto: Brigada Gassan Kanafani        

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