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sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

A complexa agenda de política externa para Obama em 2014

 Como acontece desde que assumiu o cargo, os problemas mais perigosos para os Estados Unidos estão localizados no Oriente Médio.
Jim Lobi (IPS)
Arquivo

Washington (IPS) - Se o presidente dos Estados Unidos Barack Obama concebesse suas perspectivas de política externa para 2014 como algum popular videogame infantil, as “serpentes” que teria que esquivar superariam em muito as “escadas” que o impulsariam ao êxito.

Como acontece desde que assumiu o cargo, as “serpentes” mais perigosas estão no Oriente Médio, a região na qual o democrata Obama tenta desesperadamente sair dos muitos poços cavados por seu antecessor, o republicano George W. Bush (2001-2009), para poder centrar mais sua atenção na Ásia e, especificamente, enfrentar o crescimento da China.

Sulcar os mares cada vez mais encrespados das relações entre os estados da Ásia provavelmente também se tornará mais arriscado no novo ano.

Em 2013 evitou, com êxito (e com a improvável ajuda do presidente da Rússia Vladimir Putin) uma intervenção militar direta na Síria, mas o efeito dominó da guerra civil no Iraque e no Líbano revela importantes novos riscos em 2014.

Isso sem mencionar a crescente instabilidade e a violência no Egito e a possibilidade de um colapso nas negociações nucleares com o Irã e suas implicações.

No Oriente Médio, o conflito entre muçulmanos xiitas e sunitas transcende cada vez mais as fronteiras nacionais, enquanto o nacionalismo parece estar vivinho e faceiro na Ásia.

As reivindicações territoriais cada vez mais rotundas de Pequim aumentaram o risco de um incidente que provoque um conflito que involucre a forças estadunidenses.

Além disso, desataram um contragolpe que, entre outras coisas, parece ter feito o primeiro ministro do Japão, Shinzo Abe, ficar valente, para afastar-se cada vez mais rápido do pacifismo posterior à Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

A defesa de Abe das ações japonesas nessa guerra, provocadoramente exposta com sua visita ao santuário de Yasukuni, em dezembro, indignou tanto a China como a Coreia do Sul. Além disso, malogrou os esforços de Washington para coordenar uma política sobre a China e sobre uma Coreia do Norte armada nuclearmente e cada vez mais imprevisível.

Evidentemente, o prestígio de Obama crescerá se conseguir recompor as relações entre Tóquio e Seul e fazer com que a China acorde regras para as zonas disputadas.

Mas, dadas as paixões nacionalistas que sacodem a região, a tarefa será difícil e crescentes os riscos em jogo.

A primordial importância que o governo atribui ao Grande Oriente Médio e à Ásia significa que a América Latina e a África subsaariana provavelmente seguirão recebendo uma atenção relativamente muito menor de Washington em 2014, como aconteceu nos últimos cinco anos.

Entretanto, crises específicas – como a possibilidade de guerra civil no Sudão do Sul – podem elevar a área ao primeiro lugar na agenda exterior, ainda que Obama tenha pouco para ganhar com a situação, ainda que seus diplomatas contribuam para impedir o pior.

Mas se a nação mais jovem do mundo se autodestruir, o presidente perderá o investimento pessoal que fez a favor da autodeterminação de Yuba e, além disso, será comparado desfavoravelmente com Bush, que teve uma de suas poucas vitórias em política externa com a negociação do acordo de paz de 2005 entre o Sudão e o Exército Sudanês de Liberação Popular (SPLA), que impulsionou a independência do sul.

O Grande Oriente Médio é a parte do mundo onde Obama enfrenta a maior quantidade de “serpentes” este ano, mas essa também é a região onde um par de “escadas” podem lhe assegurar um lugar na história como presidente exitoso em política externa.

A mais espetacular seria a conclusão exitosa de um acordo nuclear exaustivo com o Irã no contexto das negociações do P5 1 (Estados Unidos, Grã Bretanha, França, China e Rússia, mais a Alemanha), que poderiam reverter os recentes avanços atômicos de Teerã e, em contrapartida, permitir enriquecer urânio a níveis baixos.

Negociar semelhante acordo implicará abandonar 35 anos de hostilidades entre as duas nações. Também poderá facilitar sua cooperação para debilitar o conflito entre sunitas e xiitas que ameaça toda a região e para estabilizar o Afeganistão, de onde praticamente todas as tropas de combate dos Estados Unidos devem retirar-se no final do ano.

Um acordo com o Irã não alcançaria o significado estratégico da aproximação de Richard Nixon com a China no começo dos anos 70, mas faria possível importantes realinhamentos, que vão do mar Mediterrâneo até o oceano Índico e entram na Ásia central.

Entretanto, para consegui-lo, Obama enfrenta uma oposição formidável, principalmente do primeiro ministro israelense Benjamín Netanyahu e do poderoso lobby pró Israel de Washington, mas também da Arábia Saudita e outros estados do Golfo que temem que Teerã recupere a primazia regional que ostentava nos anos 70, antes da chegada dos islamitas ao poder.

Igualmente, a linha dura no Irã também objeta um acordo.

Se essas forças tiverem êxito, as consequências, como advertiu o próprio Obama, muito provavelmente podem incluir outra intervenção militar dos Estados Unidos no Oriente Médio.

Isso, por sua vez, não apenas sabotará as esperanças de Obama em reduzir a presença militar dos Estados Unidos na região e de dar um giro para a Ásia.

Sem autorização do Conselho de Segurança das Nações Unidas, tal ação, quase sem dúvida, provocaria uma importante crise internacional, que faria pedacinhos da cooperação com a Rússia e a China sobre variados assuntos, além de tencionar as relações dos Estados Unidos com seus aliados da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

Para Obama, a eventualidade de uma guerra com o Irã é, provavelmente a “serpente” mais perigosa em seu tabuleiro de 2014, mais inclusive que a escalada do conflito entre sunitas e xiitas na Síria e seus vizinhos.

A outra “escada” óbvia, que pode garantir a Obama um lugar favorável nos anais da política externa, é negociar um acordo final do conflito entre israelenses e palestinos, escorregadio “santo gral” da política dos Estados Unidos para o Oriente Médio durante mais de uma geração.

A maioria dos analistas duvidam que seja um objetivo possível e, em qualquer caso, é muito improvável que se consiga em 2014. Entretanto, a energia com que o secretário de Estado (chanceler) John Kerry se esforça em consegui-lo impressionou alguns céticos.

Além disso, ao começar o ano está oferecendo mediar propostas para um acordo de status permanente, se bem que em Washington se considera difícil conseguir, especialmente se Obama fizer um pacto nuclear com o Irã.

As “serpentes” que ameaçam Obama na região são consideravelmente mais numerosas e vão de uma escalada da violência entre o regime militar do Egito e a Irmandade Muçulmana ou forças mais radicais, até o ressurgimento da violência sectária no Iraque aos níveis de 2006 e 2007. Ou da intensificação da guerra na Síria e sua exportação ao Líbano, até o fortalecimento das forças vinculadas à rede extremista Al Qaeda em toda a região.

Ao ser 2014 o ano em que a OTAN retirará o que sobra de seu contingente do Afeganistão, cenário da guerra mais longa de Washington, um rápido colapso da segurança poderia resultar igualmente mortal e faria lembrar a debacle da guerra do Vietnã há quase 40 anos.

Qualquer desses possíveis acontecimentos, sem dúvida, será usado pelos adversários políticos de Obama em Washington para retratá-lo como um presidente mal sucedido em política externa.

Publicado em Carta Maior

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