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sábado, 30 de dezembro de 2017

As Leis da Dialética - QUARTA E ÚLTIMA LEI: LEI DO PROGRESSO POR SALTOS


I. — Reformas ou revolução:
1. A argumentação política.
2. A argumentação histórica.
3. A argumentação científica.
II — O materialismo histórico:
1. Como explicar a história?
2. A história é obra dos homens.
Resta-nos, agora, antes de abordar o problema da aplicação da dialética à história, estudar uma sua última lei.
Isso vai-nos ser facilitado pelos estudos que acabamos de fazer, e em que vimos o que é a negação da negação e o que se entende por unidade das contrárias.
Como sempre, procedemos por exemplos.

I.— Reformas ou revolução?
Diz-se, falando da sociedade: é preciso recorrer a reformas ou fazer a revolução? Discute-se para saber se, para transformar a sociedade capitalista numa socialista, se alcançará esse fim por reformas sucessivas ou por uma transformação brusca: a revolução.
Perante este problema, recordemos o que já estudamos. Toda a transformação é o resultado de uma luta de forças opostas. Se uma coisa evolui, é porque contém em si a sua contrária, sendo cada coisa uma unidade de contrárias. Constata-se a luta das contrárias e a transformação da coisa na sua contrária. Como se faz essa
transformação? É o novo problema que se põe.
Pode pensar-se que tal transformação se efetua pouco a pouco, por uma série de pequenas transformações, que a maçã verde se transforma em madura por uma série de pequenas mudanças progressivas.
Muitas pessoas pensam, assim, que a sociedade se transforma pouco a pouco e que o resultado de uma série dessas pequenas transformações será a transformação da sociedade capitalista em socialista. Pequenas transformações que são as reformas, sendo o seu total, a soma das pequenas mudanças graduais, que nos dará uma sociedade nova.
É esta a teoria a que se chama reformismo. Os partidários de tais teorias chamam-se reformistas, não porque reclamem reformas, mas porque pensam que elas bastam, que, acumulando-se, devem, insensivelmente, transformar a sociedade.
Examinemos se isso é verdade:
1. A argumentação política .  Temos o exemplo da URSS, cuja mudança não se deu por reformas, mas pela revolução. Vemos, que em outros países onde se ensaiou este sistema, não sendo pela revolução, os resultados foram negativos. A transformação da sociedade capitalista — a sua destruição—  só se dará pela revolução.
2. A argumentado histórica . É verdade que, de uma maneira geral, as coisas se transformam por pequenas mudanças, por reformas?
Vejamos sempre os fatos. Se examinarmos as mudanças históricas, veremos que não se produzem indefinidamente, que não são contínuas. Chega um momento em que, em vez de pequenas mudanças a mudança se faz por um salto brusco.
Na história das sociedades, os acontecimentos marcantes que verificamos são mudanças bruscas, revoluções; Mesmo os que não conhecem a dialética sabem, nos nossos dias, que se produziram mudanças violentas na história; no entanto, até ao século XVII, julgava-se que «a natureza não dá saltos»; não queriam ver as
transformações bruscas na continuidade das mudanças. Mas, a ciência interveio, e, pelos fatos, demonstrou que se faziam mudanças bruscamente. A Revolução de 1789 abriu ainda melhor os olhos; era ela própria um exemplo evidente de nítida ruptura com o passado. E acabou-se percebendo que todas as etapas decisivas da história foram e eram perturbações importantes, bruscas, súbitas. Por exemplo: de amigáveis que eram, as relações entre tal e tal Estado tornaram-se mais frias, depois tensas, agravaram-se, tomaram um caráter de hostilidade — e, de repente, era a guerra, brusca ruptura na continuidade dos acontecimentos. Ou, ainda: na Alemanha, depois da guerra de 1914-18, houve uma subida gradual do fascismo, depois, um dia, Hitler
tomou o poder — a Alemanha entrou numa nova etapa histórica.
Hoje, os que negam essas bruscas mudanças pretendem que são acidentes, sendo um acidente uma coisa que acontece e poderia não acontecer.
Assim se explicam as revoluções na história das sociedades: «São acidentes».
Explica-se, por exemplo, no que respeita à história da França, que a queda de Luís XVI e a Revolução francesa aconteceram porque Luís XVI era um homem fraco e indolente: «Se tivesse sido um homem enérgico, não teríamos tido a Revolução». Lê-se mesmo que, se, em Varennes não tivesse prolongado a sua refeição, não o prenderiam e o curso da história teria sido outro. Portanto, a Revolução francesa é, digamos, um acidente.
A dialética, pelo contrário, reconhece que as revoluções são necessidades. Há, na verdade, mudanças contínuas, mas, acumulando-se, acabam por produzir mudanças bruscas.
3. A argumentação científica. Tomemos o exemplo da água. Partamos de 0º, e façamos subir a sua temperatura de 1°, 2°, 3° até 98°: a mudança é contínua. Mas, isso pode continuar assim indefinidamente?
Vamos, ainda, até 99°, mas, a 100° temos uma mudança brusca: a água transforma-se em vapor.
Se, inversamente, de 99° descermos até 1º teremos. de novo, uma mudança contínua, mas, não poderemos descer assim indefinidamente, porque, a 0º, a água se transforma em gelo.
De 1º a 99°, permanece sempre água; apenas a sua temperatura muda. É o que se chama uma mudança quantitativa, que responde à pergunta: «Quanto», isto é, «que quantidade de calor tem a água?». Quando se transforma em gelo ou em vapor, temos uma mudança qualitativa, uma mudança de qualidade. Já não é água; tornou-se gelo ou vapor.
Quando a coisa não muda de natureza, temos uma mudança quantitativa (no exemplo da água, uma mudança de grau de calor, mas, não de natureza). Se muda de natureza, quando se torna outra coisa, a mudança é qualitativa.
Vemos, pois, que a evolução das coisas não pode ser indefinidamente quantitativa: transformando-se, sofrem, por fim, uma mudança qualitativa. A quantidade transforma-se em qualidade. É uma lei geral. Mas, como sempre, não devemos agarrar-nos unicamente a esta fórmula abstrata.
No livro de Engels, «Anti-Duhring», no capítulo Dialética, quantidade e qualidade, encontraremos um grande número de exemplos que farão compreender que, em tudo, como nas ciências da natureza, se verifica a exatidão da lei segundo a qual em certos graus de mudança quantitativa; produz-se, subitamente, uma conversão qualitativa60.
Eis um novo exemplo, citado por H. Wallon, no VII volume da «Enciclopédia francesa» (em que nos remete a Engels): a energia nervosa, acumulando-se numa criança, provoca o riso; mas, se continua a aumentar, o riso transforma-se em lágrimas; assim, as crianças que se excitam e riem muito, acabam por chorar.
Daremos um último exemplo bem conhecido: o do homem que apresenta a sua candidatura a um mandato qualquer. Se forem precisos 4500 votos para obter a maioria absoluta, o candidato não é eleito com 4499, continua a ser, apenas, um candidato. Com um voto mais, a mudança quantitativa determina uma qualitativa,
uma vez que o candidato, que era, se torna um eleito.
Esta lei traz-nos a solução do problema: reforma ou revolução.
Os reformistas dizem-nos: «Quereis coisas impossíveis, que apenas acontecem por acidente; sois utopistas».
Mas, com esta lei, vemos bem quais são os que sonham com coisas impossíveis! O estudo dos fenômenos da natureza e da ciência mostra-nos que as mudanças não são indefinidamente contínuas, mas que, num dado momento, se tornam bruscas. Não somos nós que, arbitrariamente, o afirmamos, é a ciência, a natureza, a realidade!
Pode, então, perguntar-se: que papel representamos nós nessas transformações bruscas?
Vamos responder a esta pergunta, e desenvolver tal problema com a aplicação da dialética à história. Eis nos chegando a uma parte muito célebre do materialismo dialético: o materialismo histórico.

O que é o materialismo histórico? É simplesmente, agora que se conhece o que é a dialética, a aplicação desse método à história das sociedades humanas.
Para compreender isto melhor, é necessário definir o que é a história. Quem diz história diz mudança, e mudança na sociedade. A sociedade tem uma história, no decurso da qual muda continuamente; vemos produzirem-se nela grandes acontecimentos. Então, põe-se o seguinte problema: uma vez que, na história, as
sociedades mudam, o que é que explica essas mudanças?
1. Como explicar a história?
É assim que nos perguntamos: «Que faz com que haja guerras? Os homens deveriam poder viver em paz!».
A estas perguntas, vamos dar respostas materialistas.
A guerra, explicada por um cardeal, é uma punição de Deus; é uma resposta idealista, porque explica os acontecimentos por Deus; é explicar a história pelo espírito. Aqui, é o espírito que cria e faz a história.
Falar da Providência é, também, uma resposta idealista. É Hitler que, em «Mein Kampf», nos diz que a história é obra da Providência, agradecendo-lhe ter posto o lugar do seu nascimento na fronteira austríaca.
Tornar Deus ou a Providência responsáveis pela história, eis uma teoria cômoda: os homens nada podem, e, por conseguinte, nada há a fazer contra a guerra, é preciso consenti-la.
Podemos nós, do ponto de vista científico, sustentar uma tal teoria, encontrar nos fatos a sua justificação?
Não.
A primeira afirmação materialista, nesta discussão, é que a história não é obra de Deus, mas dos homens.
Então, os homens podem agir sobre a história e impedir a guerra.
2. A história é obra dos homens.
Os homens fazem a sua história, seja qual for o caminho que tome, prosseguindo cada um os seus próprios fins, conscientemente desejados, e são, precisamente, os resultados dessas numerosas vontades, atuando em sentidos diferentes, e as suas variadas repercussões sobre o mundo exterior que constituem a história.
Trata-se, também, por conseguinte, do que querem os numerosos indivíduos, tomados isoladamente. A vontade é determinada pela paixão ou pela reflexão... Mas, as alavancas que, por sua vez, determinam diretamente a paixão ou a reflexão são de natureza muito diversa... Ainda pode perguntar-se... quais as causas históricas que, nos cérebros dos homens que agem, se transformam nesses motivos.61
Este texto de Engels diz-nos, portanto, que são os homens que agem segundo as suas vontades, mas estas não se orientam sempre no mesmo sentido! O que é que determina, faz, então, as ações dos homens? Por que não caminham as suas vontades no mesmo sentido?
59 Friedrich Engels: “Anti-Duhring”
60 Friedrich Engels: “Anti-Duhring”
61 Friedrich Engels: “Ludwig Feuerbach”
  LEITURAS
F. Engels: Anti-Duhring”, capituloXII: Dialética Quantidade e dualidade, p 151.
Lênin: “Materealismo e Empirocriticistas”,pag 324:  A propósito da dialética.

F. Engels: “Ludwig Feuerbach”, capitulo IV: O materealismo dialético,PP. 32 e seguinte. 




terça-feira, 26 de dezembro de 2017

As Leis da Dialética - A Contradição


TERCEIRA LEI: A CONTRADIÇÃO
I. — A vida e a morte.
II. — As coisas transformam-se na sua contrária.
III. — Afirmação, negação e negação da negação.
IV. — Recapitulemos.
V. — A unidade das contrárias.
VI. — Erros a evitar.
VII. — Consequências práticas da dialética.
Vimos que a dialética considera as coisas como estando em perpétua mudança, evoluindo continuamente, numa palavra, sofrendo um movimento dialético (1.ª Lei).
Este movimento é possível, porque toda e qualquer coisa não é mais do que o resultado, no momento em que a estudamos, de um encadeamento de processos, isto é, de fases que saem umas das outras. E, levando o nosso estudo mais adiante, vimos que esse encadeamento se desenvolve necessariamente no tempo num movimento progressivo, «apesar dos retrocessos momentâneos».
Chamamos a esse desenvolvimento um «desenvolvimento histórico» ou «em espiral», e sabemos que se gera a si mesmo, por autodinamismo.
Mas, quais são, agora, as leis do autodinamismo? Quais as que permitem às fases sair umas das outras?
Chamam-se as «leis do movimento dialético».
A dialética ensina-nos que as coisas não são eternas: têm um começo, uma maturidade, uma velhice, que termina num fim, a morte.
Todas as coisas passam por essas fases: nascimento, maturidade, velhice, fim. Por que acontece assim? Por que não são as coisas eternas?
Eis uma velha pergunta que sempre apaixonou a humanidade. Por que é preciso morrer? Não se compreende esta necessidade, e os homens, no decurso da história, sonharam com a vida eterna, com os meios de mudar tal estado de coisas, na idade média, por exemplo, inventando bebidas mágicas (elixires de juventude ou da vida).
Por que é que o que nasce é, portanto, obrigado a morrer? Eis uma grande lei da dialética, que deveremos confrontar, para bem a compreender, com a metafísica.

1— A vida e a morte.
Do ponto de vista metafísico, consideram-se as coisas de um modo isolado, tomadas em si mesmas, e, porque a metafísica as estuda assim, considera-as de uma maneira unilateral, isto é, de um só lado. É por isso que se pode dizer, dos que as vêem de um só lado, que são metafísicos. Em poucas palavras, quando um metafísico examina o fenômeno a que se chama vida, fá-lo sem o relacionar a qualquer outro. Vê a vida, por
si e em si, de uma maneira unilateral. Vê-a de um só lado. Se examinar a morte, fará a mesma coisa; aplicará o seu ponto de vista unilateral, e concluirá dizendo: a vida é a vida, a morte é a morte. Entre ambas, nada de comum; não se pode estar ao mesmo tempo vivo e morto, porque são duas coisas opostas, inteiramente contrárias uma à outra.
Ver assim as coisas, é fazê-lo de uma maneira superficial. Se as examinarmos um pouco mais de perto, veremos, primeiro, que não as podemos opor uma à outra, não podemos mesmo separá-las tão brutalmente, uma vez que a experiência e a realidade nos mostram que a morte continua a vida, que a morte vem do vivo.
E a vida, pode sair da morte? Sim. Porque os elementos do corpo morto vão transformar-se para dar origem a outras vidas e servir de adubo à terra, que será mais fértil, por exemplo. A morte, em muitos casos, auxiliará a vida, permitirá a esta nascer; e, nos próprios corpos vivos, a vida só é possível porque há uma contínua substituição das células que morrem por outras que nascem53.
Portanto, a vida e a morte transformam-se continuamente uma na outra, e, em todas as coisas, constatamos a constância desta grande lei: por toda a parte, as coisas transformam-se na sua contrária.

II. — As coisas transformam-se na sua contrária.
Os metafísicos opõem as contrárias, mas, a realidade demonstra-nos que estas se transformam uma na outra, que as coisas não permanecem elas próprias, se transformam nas suas contrárias.
Se examinarmos a verdade e o erro, pensamos: não há nada de comum entre eles. A verdade é a verdade, um erro é um erro. Este o ponto de vista unilateral, que opõe brutalmente as duas contrárias, como se oporia a vida e a morte.
E, todavia, se dizemos: «Olha, chove!», acontece que, por vezes, ainda não acabamos de o dizer e já não chove. Essa frase era exata, quando a começamos, e transformou-se em erro. (Os Gregos já tinham constatado isso, e diziam que, para não errar, era preciso não dizer nada!)
Do mesmo modo, retomemos o exemplo da maçã. Vê-se na terra uma maçã madura, e diz-se: «Eis uma maçã madura». Contudo, estando na terra há um certo tempo, já começa a decompor-se, de tal forma que a verdade se transforma em erro.
Também as ciências nos dão numerosos exemplos de leis consideradas, durante muitos anos, como «verdades», que se revelaram, num dado momento, após os progressos científicos, como «erros».
Vemos, portanto, que a verdade se transforma em erro. Mas, será que o erro se transforma em verdade?
No início da civilização, os homens imaginavam, sobretudo no Egipto, combates entre os deuses, para explicar o nascer e o pôr do sol; era um erro, na medida em que se dizia que os deuses empurravam ou  puxavam o sol, para o fazer mover. Mas, a ciência dá parcialmente razão a esse raciocínio, dizendo que há, efetivamente, forças (puramente físicas, aliás) que fazem mover o sol. Veremos, pois, que o erro não está
nitidamente oposto à verdade.
Se, portanto, as coisas se transformam na sua contrária, como é isso possível? Como se transforma a vida na morte?
Se houvesse apenas vida, a vida cem por cento, ela nunca poderia ser a morte, e se a morte fosse totalmente ela própria, a morte cem por cento, seria impossível que uma se transformasse na outra. Mas, já existe morte na vida e, por conseguinte, vida na morte.
Observando de perto, veremos que um ser vivo é composto de células, que estas se renovam, desaparecem e reaparecem no mesmo lugar. Vivem e morrem continuamente num ser vivo, onde existe, portanto, vida e morte.
Sabemos, também, que a barba de um morto continua a crescer. O mesmo acontece com as unhas e os cabelos. Eis fenômenos nitidamente caracterizados, que provam que a vida continua na morte.
Na Rússia, conserva-se, em condições especiais, sangue de cadáveres, que serve para fazer transfusões: assim, com o sangue de um morto, refaz-se um vivo. Podemos dizer que, por conseguinte, no seio da morte há a vida.
A vida é, pois, igualmente uma contradição «existente nas coisas e nos fenômenos em si», uma contradição que, constantemente, se apresenta e resolve; logo que a contradição cessa, a vida cessa também, intervém a morte54.
Assim, as coisas não só' se transformam umas nas outras, mas, ainda, uma coisa não é apenas ela própria, mas outra que é a sua contrária, porque cada coisa contém a sua contrária.
Toda a coisa é, ao mesmo tempo, ela própria e a sua contrária.
Se se representa uma coisa por um círculo, teremos uma força que a impelirá para a vida, empurrando do centro para o exterior, por exemplo (expansão); mas teremos, também, forças que a impelirão numa direção oposta, forças de morte, empurrando do exterior para o centro (compressão).
Assim, no interior de cada coisa, coexistem forças opostas, antagonismos.
Que se passa entre essas forças? Lutam. Por conseguinte, uma coisa não é apenas movida por uma força agindo num só sentido, mas toda a coisa é, realmente, movida por duas forças de direções opostas. Para a afirmação e para a negação das coisas, para a vida e para a morte. Que significa: afirmação e negação das coisas?
Existem, na vida, forças que a mantêm, que tendem para a sua afirmação. Além dessas, também existem nos organismos outras que tendem para a negação. Em todas as coisas, há forças que tendem para a afirmação e outras para a negação, e, entre a afirmação e a negação, contradição.
Portanto, a dialética constata a mudança; mas, por que mudam as coisas? Porque não estão de acordo consigo próprias, porque há luta entre as forças, entre os antagonismos internos, porque há contradição. Eis a terceira lei da dialética: As coisas mudam, porque contêm em si mesmas a contradição.
(Se somos obrigados, por vezes, a empregar palavras mais ou menos complicadas (como dialética, autodinamismo, etc.) ou termos que parecem contrários à lógica tradicional e difíceis de compreender, não é pelo prazer de complicar às coisas, e, nisso, imitar a burguesia. Não. Mas, este estudo, embora elementar, pretende ser tão completo quanto possível e permitir ler, em seguida, mais facilmente, as obras filosóficas de Marx-Engels e Lenine, que empregam esses termos. Em todo o caso, uma vez que devemos empregar uma linguagem que não é usual, procuraremos, no âmbito deste estudo, torná-la compreensível a todos.)

III. — Afirmação, negação e negação da negação.
É necessário fazermos, aqui, uma distinção entre o que se chama a contradição verbal —que significa responder «não», quando alguém vos diz «sim» — e a que acabamos de ver, a chamada contradição dialética, isto é, nos fatos, nas coisas.
Quando falamos da contradição que existe no seio da sociedade capitalista, isso não significa que, sobre certas teorias, uns dizem sim, outros não; quer dizer que há uma contradição nos fatos, forças reais que se combatem: primeiro, uma força que tende a afirmar-se, é a classe burguesa que procura manter-se; depois, uma segunda força social que tende para a negação da classe burguesa, é o proletariado. A contradição está, pois, nos fatos, porque a burguesia não pode existir sem criar a sua contrária, o proletariado. Como disse Marx, “antes de tudo» a burguesia produz os seus próprios coveiros55.
Para impedir isso, seria necessário que a burguesia renunciasse a ser ela própria, o que seria absurdo. Por conseguinte, afirmando-se, criou a sua própria negação.
Tomemos o exemplo de um ovo que é posto e chocado por uma galinha: constatamos que, nele, se encontra o germe que, a uma certa temperatura e em certas condições, se desenvolve. Desenvolvendo-se, dará um pintinho: deste modo, o germe é já a negação do ovo. Veremos que, sem dúvida, no ovo há duas forças: a que tende para que permaneça um ovo e a que tende a que se torne pintinho. O ovo está, portanto, em desacordo consigo próprio, e todas as coisas o estão consigo mesmas.
Isto pode parecer difícil de compreender, porque estamos habituados ao modo de raciocinar metafísico, e é por isso que devemos fazer um esforço para nos habituar a ver, novamente, as coisas na sua realidade.
Uma coisa começa por ser uma afirmação que sai da negação. O pintinho é uma afirmação resultante da negação do ovo. É esta uma fase do processo.
Mas a galinha será, por sua vez, a transformação do pintinho, havendo, no centro desta transformação, uma contradição entre as forças que lutam para que o pintinho se torne galinha e as que lutam para que permaneça pintinho. A galinha será, pois, a negação do pintinho, que vinha, por sua vez, da negação do ovo.
A galinha será, por conseguinte, a negação da negação. E isso é a marcha geral das fases da dialética.
1. Afirmação diz-se também Tese.
2. Negação ou Antítese.
3. Negação da negação ou Síntese.
Estas três palavras resumem o desenvolvimento dialético. Empregam-se para representar o encadeamento das fases, para indicar que cada uma é a destruição da precedente.
A destruição é uma negação. O pintinho é a negação do ovo, uma vez que, nascendo, o destrói. A espiga de trigo é, da mesma maneira, a negação do grão de trigo. O grão, na terra, germinará; essa germinação é a negação do grão de trigo, que dará a planta, que, por sua vez, florirá e dará uma espiga; esta será a negação da planta ou a negação da negação.
Vemos, pois, que a negação de que fala a dialética é uma maneira resumida de falar da destruição. Há a negação do que desaparece, do que é destruído.
1. O feudalismo foi a negação do escravagismo.
2. O capitalismo é a negação do feudalismo.
3. O socialismo é a negação do capitalismo.
Assim como para a contradição, em que fizemos uma distinção entre contradição verbal e lógica, devemos compreender bem o que é a negação verbal, que diz «não», e a dialética, que quer dizer «destruição».
Mas, se a negação significa destruição, não se trata de qualquer destruição, mas de uma destruição dialética.
Assim, quando esmagamos uma pulga, ela não morre por destruição interna, por negação dialética. A sua destruição não é o resultado de fases autodinâmicas; é o de uma mudança puramente mecânica.
A destruição só é uma negação se for um produto da afirmação, se dela sair. Assim: o ovo chocado, sendo a afirmação do que o ovo é, origina a sua negação - torna-se pintinho, e este simboliza a destruição ou negação do ovo, rompendo, destruindo a casca.
No pintinho, vemos duas forças adversas: «pintinho» e «galinha»; no decurso deste desenvolvimento do processo, a galinha porá ovos, nova negação da negação. Destes, partirá, então, um novo encadeamento do processo.
Para o trigo, vemos, também, uma afirmação, depois, uma negação e uma negação da negação.
Como outro exemplo, daremos o da filosofia materialista.
No início, encontramos um materialismo primitivo, espontâneo, que, por ignorante, cria a sua própria negação: o idealismo. Mas este, negando o antigo materialismo, será negado pelo moderno ou dialético, porque a filosofia se desenvolve e provoca, com as ciências, a destruição do idealismo. Também aqui, portanto, temos; afirmação, negação e negação da negação.
Constatamos, igualmente, tal ciclo na evolução da sociedade.
Verificamos, no começo da história, a existência de uma sociedade de comunismo primitivo, sem classes, baseada na propriedade comum do solo. Mas, tal forma de propriedade torna-se um entrave ao desenvolvimento da produção, criando, por isso mesmo, a sua própria negação: a sociedade com classes, baseada na propriedade privada e na exploração do homem pelo homem. Mas, essa sociedade traz também
consigo a sua própria negação, porque um desenvolvimento superior dos meios de produção leva à necessidade de negar a divisão da sociedade em classes, a propriedade privada, e regressamos, assim, ao ponto de partida: a necessidade da sociedade comunista, mas num outro plano; no início, tínhamos uma falta de produtos; hoje, temos uma capacidade de produção muito elevada.
Observamos, a este respeito, por todos os exemplos que demos, que regressamos sempre ao ponto de partida, mas num outro plano (desenvolvimento em espiral), um plano mais elevado.
Vemos, pois, que a contradição é uma grande lei da dialética. Que a evolução é uma luta de forças antagonistas. Que não só as coisas se transformam umas nas outras, mas, também, cada uma na sua contrária.
Que as coisas não estão de acordo consigo próprias, porque há, nelas, luta entre forças opostas, uma contradição interna.
Nota. Devemos prestar bem atenção a isto: a afirmação, a negação, a negação da negação são apenas expressões resumidas das várias fases da evolução dialética, não sendo preciso correr mundo para encontrar essas três fases por toda a parte. É certo que não as encontraremos sempre todas; mas, por vezes, só a primeira ou a segunda, não estando a evolução terminada, É desnecessário, pois, querer ver, mecanicamente, em todas as coisas, essas mudanças tal qual. Fixemos, sobretudo, que a contradição é a grande lei da dialética. É o essencial.

IV. — Recapitulemos.
Sabemos já que a dialética é um método de pensar, raciocinar, analisar, que permite fazer boas observações e estudar bem, porque nos obriga a procurar a origem das coisas e a descrever a história.
Certamente, o antigo método de pensar, vimo-lo, teve a sua necessidade no seu tempo. Mas, estudar com o método dialético é constatar, repetimo-lo, que todas as coisas, na aparência imóveis, são apenas um encadeamento de processos onde tudo tem um começo e um fim, onde em tudo, finalmente, apesar de todos os insucessos aparentes e retrocessos momentâneo um desenvolvimento progressivo acaba por se fazer hoje56.
Só a dialética nos permite compreender o desenvolvimento, a evolução das coisas; só ela nos permite compreender a destruição das antigas e o nascimento das novas. Só a dialética nos faz compreender todos os desenvolvimentos nas suas transformações, conhecendo-os como todos formados de contrárias. Porque, para a concepção dialética, o desenvolvimento natural das coisas, a evolução, é uma luta contínua de forças e princípios opostos.
Assim, pois, para a dialética, a primeira lei é a constatação do movimento e da mudança: «Nada permanece o que é, nada fica onde está» (Engels). Sabemos, agora, que a explicação desta lei reside em que as coisas mudam, não só transformando-se umas nas outras, mas, também, nas suas contrárias. A contradição é, portanto, uma grande lei da dialética.
Estudamos o que é, do ponto de vista dialético, a contradição, mas é necessário insistir ainda, para fazer certas precisões e, também, para assinalar alguns erros que é preciso não cometer.
É bem certo que, primeiro, é necessário familiarizarmo-nos com esta afirmação, que está de acordo com a realidade: a transformação das coisas nas suas contrárias. Certamente, ela fere o entendimento, admira-nos, porque estamos habituados a pensar com o velho método metafísico. Mas, vimos porque é assim; vimos, de uma maneira detalhada, por meio de exemplos, que isso está na realidade e porquê as coisas se transformam nas suas contrárias.
É por isso que se pode dizer e afirmar que, se as coisas se transformam, mudam, evoluem, é porque estão em contradição com elas próprias, trazem em si a sua contrária, contêm a unidade das contrárias.

V. — A unidade das contrárias.
Cada coisa é uma unidade de contrárias.
Afirmar isso parece, à primeira vista, um absurdo. «Uma coisa e a sua contrária nada têm de comum», eis o que se pensa em geral. Mas, para a dialética, toda a coisa é, ao mesmo tempo, ela própria e a sua contrária, uma unidade de contrárias, e é preciso explicar bem isso.
A unidade das contrárias, para um metafísico, é uma coisa impossível: Para ele, as coisas são feitas de uma só peça, de acordo com elas próprias, e eis que afirmamos o contrário, ao saber que são feitas de duas peças — elas próprias e as suas contrárias — e que nelas há duas forças que se combatem, porque as coisas não estão de acordo com elas próprias, se contradizem a si mesmas.
Se tomarmos o exemplo da ignorância e da ciência, isto é, do saber, sabemos que, do ponto de vista metafísico, são duas coisas totalmente opostas e contrárias uma à outra. O que é ignorante não é um sábio, e o que é um sábio não é um ignorante,
No entanto, se olharmos os fatos, vemos que não dão lugar a uma oposição tão rígida. Vemos que, primeiramente, reinou a ignorância, depois é que veio a ciência; e, aí, verificamos que uma coisa se transforma na sua contrária: a ignorância em ciência.
Não há ignorância sem ciência, não há ignorância cem por cento. Um indivíduo, por muito ignorante que seja, sabe reconhecer, pelo menos, os objetos, a sua alimentação; não há nunca ignorância absoluta; existe sempre uma percentagem de ciência na ignorância. A ciência está já, em germe, na ignorância; é, pois, justo afirmar que a contrária de uma coisa está na coisa em si.
Vejamos, agora, a ciência. Pode haver ciência cem por cento? Não. Ignora-se sempre qualquer coisa. Disse Lenine: «O objeto do conhecimento é inesgotável»; o que significa que há sempre que aprender. Não há ciência absoluta. Todo o saber, toda a ciência contém uma parte de ignorância57.
O que  existe, na realidade, é uma ignorância e uma ciência relativas, uma mistura de ambas.
Não é, portanto, a transformação das coisas nas suas contrárias que constatamos neste exemplo, mas, é, na mesma coisa, a existência das contrárias ou a unidade das contrárias.
Poderíamos retomar os exemplos que já vimos: a vida e a morte, a verdade e o erro, e constataríamos que, num e noutro caso, como em todas as coisas, existe uma unidade das contrárias, isto é, que cada uma contém, ao mesmo tempo, ela própria e a sua contrária. É por isso que Engels dirá: Se, na pesquisa, nos inspirarmos constantemente neste ponto de vista, deixa-se, de uma vez para sempre, de procurar soluções definitivas e verdades eternas; tem-se sempre consciência do caráter necessariamente limitado de todo o conhecimento adquirido, da sua dependência acerca das condições nas quais foi adquirido; não mais deixar-se iludir pelas antinomias, irredutíveis para a velha metafísica sempre em uso, do verdadeiro e do falso, do bem e do mal, do idêntico e do diferente, do fatal e do fortuito; sabe-se que
estas têm apenas um valor relativo, que o que é conhecido agora como verdadeiro tem o seu lado falso escondido, que aparecerá mais tarde, assim como o que é atualmente reconhecido como falso tem o seu lado verdadeiro, graças ao qual pôde, anteriormente, ser considerado como verdadeiro58.
Este texto de Engels mostra-nos bem como é preciso compreender a dialética e o sentido verdadeiro da unidade das contrárias.

VI. — Erros a evitar.
É preciso explicar bem essa grande lei da dialética que é a contradição, para não criar mal-entendidos.
Primeiro, é-nos necessário compreendê-la de uma maneira mecânica. É desnecessário pensar que, em todo o conhecimento, existe a verdade mais o erro, ou o verdadeiro mais o falso.
Se se aplicasse essa lei assim, dar-se-ia razão aos que dizem que, em todas as opiniões, há uma parte de verdadeiro mais uma parte de falso, e que: «retiremos o que é falso, ficará o verdadeiro, o que é bom». Diz-se isso em certos meios pretensamente marxistas, em que se pensa que o marxismo tem razão em mostrar que, no capitalismo, há fábricas, monopólios, bancos que têm nas mãos a vida econômica, que têm razão para dizer que esta caminha mal; mas, o que é falso no marxismo, acrescente-se, é a luta de classes: deixemos de lado a teoria da luta de classes, e teremos uma boa doutrina. Diz-se, também, que o marxismo, aplicado ao estudo da sociedade, é justo, verdadeiro, «mas, para quê misturar-lhe a dialética? Eis o lado falso, retiremos esta, e guardemos como verdadeiro o resto do marxismo!».
São estas interpretações mecânicas da unidade das contrárias.
Eis, ainda, um outro exemplo: Proudhon pensava, depois de ter tomado conhecimento da teoria das contrárias, que, em cada coisa, havia um lado bom e outro mau. Também, ao constatar que, na sociedade, existe a burguesia e o proletariado, dizia: Retiremos o que é mau: o proletariado! E é assim que põe de pé o seu sistema de créditos, que deviam criar a propriedade parcelar, isto é, permitir aos proletários tornar-se proprietários; dessa maneira, só haveria burgueses, e a sociedade seria boa.
Sabemos bem, no entanto, que não há proletariado sem burguesia e que esta só existe pelo proletariado: são duas contrárias inseparáveis. Tal unidade é interna, verdadeira: é uma união inseparável. Não basta, pois, para as suprimir, separar uma da outra. Numa sociedade baseada na exploração do homem pelo homem, existem, obrigatoriamente, duas classes antagônicas: amos e escravos, na antiguidade, senhores e servos, na idade média, burguesia e proletariado, nos nossos dias.
Para suprimir a sociedade capitalista, criar a sociedade sem classes, é preciso suprimir a burguesia e o proletariado — para permitir aos homens livres criar uma sociedade mais evoluída, material e intelectualmente, para caminhar para o comunismo na sua forma superior, e não para, como pretendem os adversários, criar um comunismo «igualitário na miséria».
Devemos, portanto, prestar bem atenção quando explicamos ou aplicamos, a um exemplo ou a um .estudo, a unidade das contrárias. Devemos evitar querer, em tudo e sempre, encontrar e aplicar mecanicamente, por exemplo, a negação da negação, a unidade das contrárias, porque os nossos conhecimentos são, em geral, muito limitados, e isso pode levar-nos a situações críticas.
O que conta é o princípio: a dialética e as suas leis obrigam-nos a estudar as coisas para descobrir a evolução e as forças, as contrárias que determinam essa evolução. É-nos preciso, pois, estudar a unidade das contrárias contida nas coisas, e esta equivale a dizer que uma afirmação não é nunca uma afirmação absoluta, uma vez que contém, em si mesma, uma parte de negação. E isso é o essencial: é por as coisas conterem a sua própria negação que se transformam. A negação é o «dissolvente»: se não existisse, as coisas não mudariam. Como, de fato, estas se transformam, é preciso, na verdade, que contenham um princípio dissolvente. Podemos, de antemão, afirmar que existe, uma vez que vemos as coisas evoluir,
mas, não podemos descobrir tal princípio sem um estudo minucioso da própria coisa, porque ele não tem o mesmo aspecto em todas as coisas.

VII. — Consequências práticas da dialética.
Praticamente, portanto, a dialética obriga-nos a considerar sempre, não apenas um lado das coisas, mas ambos: não considerar nunca a verdade sem o erro, a ciência sem a ignorância. O grande erro da metafísica é, justamente, considerar só um dos seus lados, julgar de uma maneira unilateral, e se cometemos muitos erros é sempre na medida em que vemos apenas um lado das coisas, é porque temos, muitas vezes,
raciocínios unilaterais.
Se a filosofia idealista afirma que o mundo existe só nas ideias dos homens, é preciso reconhecer que há, com efeito, coisas que não existem senão no nosso pensamento. Isso é verdade. Mas o idealismo é unilateral, vê apenas esse aspecto. Vê só o homem que inventa coisas que não estão na realidade, e, daí, conclui que nada existe fora das nossas ideias. O idealismo tem razão em sublinhar essa faculdade do homem, mas, aplicando apenas o critério da prática, não vê senão isso.
O materialismo metafísico também se engana, porque vê apenas um lado dos problemas. Vê o universo como uma mecânica. A mecânica existe? Sim! Desempenha um papel importante? Sim! O materialismo metafísico tem, pois, razão em afirmar isso, mas, é um erro ver o movimento mecânico.
Naturalmente, somos levados a ver um só lado das coisas e das pessoas. Se julgamos um camarada, vemos, quase sempre, apenas o seu lado bom ou o mau. É preciso ver um e outro, sem o que não seria possível ter quadros nas organizações. Na prática política, o método do julgamento unilateral leva ao sectarismo. Se encontramos um adversário pertencente a uma organização reacionária, julgamo-lo segundo os seus chefes.
E, no entanto, não é mais, talvez, que um modesto empregado revoltado, descontente, e não o devemos julgar como a um importante patrão fascista. Pode, da mesma maneira, aplicar-se este raciocínio aos patrões, e compreender que, se nos parecem maus, é, muitas vezes, porque eles próprios são dominados pela estrutura da sociedade, e que, noutras condições sociais, seriam, talvez, diferentes.
Se atendermos à unidade das contrárias, consideraremos as coisas sob os seus múltiplos aspectos. Veremos, portanto, que esse reacionário é reacionário, por um lado, mas, por outro, é um trabalhador, havendo nele uma contradição. Investigando, verificaremos porque aderiu a essa organização, procurando, ao mesmo tempo, indagar porque deveria não ter aderido. E, então, julgaremos e discutiremos, assim, de uma maneira menos sectária.
Devemos, pois, de acordo com a dialética, considerar as coisas sob todos os ângulos que se lhe possam distinguir.
Para resumir, e como conclusão teórica, diremos: as coisas mudam, porque encerram uma contradição interna (elas próprias e as suas contrárias). As contrárias estão em conflito, e as mudanças nascem desses conflitos; assim, a mudança é a solução do conflito.
O capitalismo contém esta contradição interna, esse conflito entre o proletariado e a burguesia; a mudança explica-se por tal conflito, e a transformação da sociedade capitalista em socialista é a sua supressão.
Há mudança, movimento, onde haja contradição. Esta é a negação da afirmação, e quando o terceiro termo, a negação da negação, se alcança, aparece a solução, porque, nesse momento, a razão da contradição é eliminada, ultrapassada.
Pode, pois, dizer-se que, se as ciências: a química, a física, a biologia, etc., estudam as leis da mudança que lhes são particulares, a dialética estuda as mais gerais. Engels disse: A dialética é apenas a ciência das leis gerais do movimento e do desenvolvimento da natureza, da sociedade humana o do pensamento59.

53 «Enquanto consideramos as coisas como em repouso e sem vida, cada uma por si, uma ao lado e após a outra, não nos apercebemos, certamente, de qualquer contradição entre elas. Encontramos certas propriedades que são, em parte, comuns, em parte, diversas, até contraditórias, mas que, neste caso, são repartidas por coisas diferentes, não contendo, portanto, contradição em si mesmas. Nos limites deste domínio de observação, ficamo-nos pelo modo de pensar corrente, o metafísico. Mas procederemos de maneira diferente, se considerarmos as coisas nos seus movimento, mudança, vida, ação recíproca uma sobre a outra. Aí, caímos imediatamente nas contradições.» (Fríedrích ENGELS: «Anti-Duhring»)
54 Friedrich ENGELS: «Anti-Duhring»
55 Karl MARX e Friedrich ENGELS: «Manifesto do Partido comunista», Ed. Avante
56 Friedridh ENGELS, «Ludwig Feuerbach»
57 «A história das ciências é a da eliminação progressiva do erro, isto é, da sua substituição por um erro novo, mas cada vez menos absurdo.» (ENGELS)
58 Friedrich ENGELS: «Ludwig Feuerbach»

LEITURAS
ENCELS: «Anti-Dühring», capítulo XIII: Dialética. Negação da negação, p. 161. Capítulo XIV: Conclusão, p. 175.
LÉNINE: «Karl Marx e a sua doutrina»: A dialética.