Por
Religioso, jornalista e revolucionário, Frei Caneca é
condenado à morte em 1825, por rebelar-se contra o Império na Confederação do
Equador
“Em todo o Brasil a Justiça pode ser comprada”,
escreveu, no início do século XIX, visitante estrangeiro. Regra marcou ação dos
juízes, do Império à República
Estudo especial de Fábio Konder Comparato
| Imagem: Antonio Parreiras
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O Judiciário no Brasil, segundo Comparato (1)
Em estudo especial, um grande jurista brasileiro traça história de umpoder submisso às elites, corrupto em sua essência e comprometido secularmente com a Injustiça
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Em estudo especial, um grande jurista brasileiro traça história de umpoder submisso às elites, corrupto em sua essência e comprometido secularmente com a Injustiça
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Brasil monárquico
A permanente duplicidade de ordenamentos jurídicos – um oficial, raramente aplicado, e outro não-oficial, mas sempre efetivo – acentuou-se após a independência do país. Como escreveu Sérgio Buarque de Holanda, “dificilmente se podem compreender os traços dominantes da política imperial sem ter em conta a presença de uma constituição ‘não escrita’ que, com a complacência dos dois partidos, se sobrepõe em geral à carta de 24 e ao mesmo tempo vai solapá-la”.[14]
A permanente duplicidade de ordenamentos jurídicos – um oficial, raramente aplicado, e outro não-oficial, mas sempre efetivo – acentuou-se após a independência do país. Como escreveu Sérgio Buarque de Holanda, “dificilmente se podem compreender os traços dominantes da política imperial sem ter em conta a presença de uma constituição ‘não escrita’ que, com a complacência dos dois partidos, se sobrepõe em geral à carta de 24 e ao mesmo tempo vai solapá-la”.[14]
A revolta política que levou à independência do país
fez-se sob a égide de um pequeno grupo de intelectuais, fascinados pelos ideais
libertários e igualitários da Revolução Francesa, logo depois consolidada em
forma monárquica, ideais esses que inspiraram a redação de nossa primeira Carta
Política. Para os potentados econômicos locais, porém, o que importava, antes
de tudo, era o acesso aos principais cargos administrativos e políticos,
monopolizados pelos homens de ultramar.
A Constituição de 1824 estabeleceu, solenemente, “a
Divisão e harmonia dos Poderes Políticos” como “o princípio conservador dos
Direitos dos Cidadãos e o mais seguro meio de fazer efetivas as garantias que a
Constituição oferece” (art. 9). De acordo com tal princípio, o Poder Judicial
passou a ser um dos quatro Poderes Políticos (art. 10). Na vida real, porém,
essa proclamada autonomia dos órgãos judiciários em relação aos demais Poderes
foi sempre ilusória. O corpo de magistrados permaneceu estreitamente ligado às
famílias dos ricos proprietários no plano local, e subordinado ao Poder
Executivo central na Corte.
Em 1827, reproduzindo modelo já existente em Portugal,
foi criado o cargo de juiz de paz, a ser preenchido por pessoas sem formação
específica e não remuneradas, eleitas pelos cidadãos de cada paróquia. O Código
de Processo Criminal de 1832, promulgado sob o influxo das ideias liberais,
confirmou a inovação e ampliou a competência desses magistrados. Nos
processos-crimes, cabia-lhes realizar o corpo de delito, prender e interrogar
os suspeitos, bem como denunciá-los perante o juiz de direito. Nos processos
cíveis, deviam eles procurar preliminarmente a conciliação entre as partes,
tendo competência para julgar as causas de pequeno valor. Além disso, atuavam
ainda os juízes de paz em matéria eleitoral, determinando em cada pleito quem
teria direito de voto.
Finalmente, competiam ainda a tais magistrados várias
funções policiais, tais como executar as posturas das Câmaras de Vereadores
sobre ordem e disciplina urbanas, resolver as contendas entre moradores do
distrito acerca de caminhos, pastos e danos contra a propriedade alheia,
destruir quilombos e comandar a força armada para desfazer ajuntamentos que
ameaçassem a ordem estabelecida.
Escusa dizer que tal instituição, malgrado sua
aparência democrática, tornou-se na realidade um instrumento decisivo no
exercício do poder local pelos senhores de engenho e grandes fazendeiros; os
quais, aliás, jamais se furtaram, em muitos casos, a se fazerem eleger, eles
próprios, como juízes de paz.
Por outro lado, e em aparente contraste com essa
hegemonia dos poderosos do sertão, o corpo de magistrados, com exceção dos
juízes de paz, permaneceu – sobretudo a partir da “política de regresso” dos
conservadores, instaurada em 1841 com a reforma do Código de Processo Criminal
– submetido ao poder político central. Competia doravante ao próprio Imperador
nomear diretamente os juízes de órfãos, os juízes municipais (com funções
diversas das dos juízes de paz), os juízes de direito (com competência
territorial mais ampla) e os promotores públicos.
Em pouco tempo, o processo de submissão do Judiciário
ao Executivo ampliou-se. A tal ponto que, em Circular de 7 de fevereiro de 1856
dirigida aos Presidentes das Províncias, o Imperador determinou que,
“competindo ao Poder Judiciário a aplicação aos casos ocorrentes das leis
penais, civis, comerciais e dos processos respectivos, cesse o abuso que
cometem muitas autoridades judiciárias, deixando de decidir os casos
ocorrentes, e sujeitando-os como dúvidas à decisão do governo imperial, pela
qual esperam, ainda que tardia seja, sobrestando e demorando a administração da
Justiça, que cabe em sua autoridade, e privando assim aos Tribunais Superiores
de decidirem em grau de recurso e competentemente as dúvidas que ocorrerem na
apreciação dos fatos e aplicação das leis”.[15]
Obviamente, no entanto, por ocasião das nomeações de
magistrados locais, os chefes políticos da Corte ou das províncias acabavam
sempre por se compor com os grandes senhores rurais, quando mais não fosse
porque as eleições políticas eram decididas por estes últimos. Ainda aí, por
conseguinte, o ordenamento jurídico oficial não existia para valer, servindo
unicamente de fachada do edifício público.
Uma duplicidade ainda mais escandalosa ocorreu,
durante todo o Império, em matéria de escravidão.
A Constituição de 1824 declarou “desde já abolidos os
açoites, a tortura, a marca de ferro quente e todas as demais penas cruéis”
(art. 179, XIX).
Em 1830, porém, foi promulgado o Código Criminal, que
previu a aplicação da pena de galés. Conforme o disposto em seu art. 44, ela
“sujeitará os réus a andarem com calceta no pé e corrente de ferro, juntos ou
separados, e a empregarem-se nos trabalhos públicos da província, onde tiver
sido cometido o delito, à disposição do Governo”. Escusa dizer que essa espécie
de penalidade, tida por não cruel pelo legislador de 1830, só se aplicava de
fato aos escravos.
E havia mais. Apesar da expressa proibição
constitucional, os cativos foram, até as vésperas da Abolição, mais
precisamente até a Lei de 16 de outubro de 1886, marcados com ferro em brasa, e
regularmente sujeitos à pena de açoite. O mesmo Código Criminal, em seu art.
60, fixava para os escravos o máximo de 50 (cinquenta) açoites por dia. Mas a
disposição legal nunca foi respeitada. Era comum o pobre diabo sofrer até
duzentas chibatadas num só dia. A lei referida só foi votada na Câmara dos
Deputados porque, pouco antes, dois de quatro escravos condenados a 300 açoites
por um tribunal do júri de Paraíba do Sul vieram a falecer.
Tudo isso, sem falar dos castigos mutilantes, como
todos os dentes quebrados, dedos decepados ou seios furados.
Ora, até a Abolição, os órgãos judiciários jamais se
preocuparam em impedir a aplicação desse direito não escrito da escravidão,
quando mais não fosse porque vários magistrados eram proprietários de fazendas,
com bom número de escravos.[16]
O melhor exemplo dessa cegueira deliberada dos órgãos
judiciários a respeito dos abusos do sistema escravista foi a permanência do
tráfico negreiro por longos anos, em situação de gritante ilegalidade.
Um alvará de 26 de janeiro de 1818, baixado pelo Rei
português ainda no Brasil, em cumprimento a tratado celebrado com a Inglaterra,
determinou a proibição do comércio infame sob pena de perdimento dos escravos,
os quais “imediatamente ficarão libertos”. Tornado o país independente,
firmou-se com a Inglaterra nova convenção, em 1826, pela qual o tráfico que se
fizesse depois de três anos da troca de ratificações seria equiparado à
pirataria. Durante a Regência, sob pressão dos ingleses, tal proibição foi
reiterada com a promulgação da Lei de 7 de novembro de 1831. Pelo teor desse
diploma legal, eram declarados livres “todos os escravos, que entrarem no
território ou portos do Brasil, vindos de fora”. Eles seriam reexportados “para
qualquer parte da África”, e os “importadores” sujeitos a processo penal;
entendendo-se por “importadores”, não só o comandante, o mestre e o
contramestre da embarcação, mas também os armadores da expedição marítima, bem
como todos aqueles que “cientemente comprarem como escravos” as pessoas
ilegalmente trazidas ou desembarcadas no Brasil.
Como se tratava simplesmente de uma “lei para inglês
ver”, segundo a expressão consagrada, nenhuma das penas nela cominadas foi
jamais aplicada em juízo. Calcula-se terem sido para aqui contrabandeados como
escravos, desde a promulgação daquele diploma legal até 1850 – quando entrou em
vigor a Lei Eusébio de Queiroz, que reiterou a proibição do tráfico negreiro –
nada menos do que 750 mil africanos.
Mesmo após a promulgação desta última lei, no entanto,
a responsabilização criminal dos traficantes de escravos e seus comparsas
deixou de ser plenamente efetivada, dado que a competência para julgar tais
crimes era do tribunal do júri, cujos integrantes submetiam-se, obviamente, à
pressão dos potentados locais. [17] Como assinalou Saint-Hilaire, “o temor das
vinganças, muito fáceis no interior, onde a polícia é quase sem força,
contribui a tornar os jurados mais indulgentes; eles são a isso levados pelo
hábito bem antigo de ceder a todas as solicitações (empenhos)”. E acrescentou
que até 1847 a própria legislação em vigor estimulava a “excessiva moleza” dos
jurados. [18]
Não era de surpreender, por conseguinte, se por efeito
da ausência de controles oficiais efetivos sobre a atuação da magistratura, sua
honestidade durante o Império tenha deixado muito a desejar.
Os mentores intelectuais da Constituição de 24 de
março de 1824, sem dúvida preocupados com a longa tradição de venalidade do
corpo judiciário durante o período colonial, decidiram incluir dois
dispositivos tendentes a extirpá-la, senão reduzi-la ao máximo:
Art. 156 – Todos os Juízes de Direito e os Oficiais de
Justiça são responsáveis pelos abusos de poder e prevaricações que cometerem no
exercício de seus Empregos; esta responsabilidade se fará efetiva por Lei
regulamentar.
Art. 157 – Por suborno, peita, peculato e concussão,
haverá contra eles ação popular, que poderá ser intentada dentro de ano e dia
pelo próprio queixoso, ou por qualquer do Povo, guardada a ordem do Processo
obedecida na Lei.
Não se sabe se tais determinações constitucionais
foram cumpridas. O que se sabe, porém, é que alguns ilustres viajantes
estrangeiros – e até o próprio Imperador D. Pedro II – fizeram questão de pôr
em foco a generalizada corrupção da magistratura, que grassou durante o período
monárquico.
No relato de sua Viagem pelas Províncias do Rio de
Janeiro e Minas Gerais, efetuada no segundo decênio do século XIX, Auguste de
Saint-Hilaire comenta que “em um país no qual uma longa escravidão fez, por
assim dizer, da corrupção uma espécie de hábito, os magistrados, libertos de
qualquer espécie de vigilância, podem impunemente ceder às tentações”. [19]
Na mesma época, o comerciante John Luccock, que para
cá viera após a Abertura dos Portos, comentando o costume da aquisição por
vizinhos, em hasta pública, de terras penhoradas pelo não pagamento de
impostos, observa:
“Nessa transação, observam-se estritamente as
formalidades legais e tem-se a ilusão de que a propriedade foi adjudicada ao
maior ofertante da hasta pública; mas na realidade, o favoritismo prevalece
sobre a justiça e o direito, pois que não há ninguém bastante atrevido para
aumentar o lance de uma pessoa de fortuna e influência.” […] “Na realidade,
parece ser de regra que em todo o Brasil a Justiça seja comprada. Esse
sentimento se acha por tal forma arraigado nos costumes e na maneira geral de
pensar, que ninguém o considera ilegal [a tort]; por outro lado, protestar
contra a prática de semelhante máxima pareceria não somente ridículo, como
serviria apenas para atirar o queixoso em completa ruína.” [20]
Aliás, como apontou Charles Darwin em seu diário da
viagem do Beagle, [21] em data de 3 de julho de 1832, quando fazia estadia no
Brasil, a desonestidade da Justiça era apenas uma parte da corrupção
generalizada do serviço público:
“Não importa o tamanho das acusações que possam
existir contra um homem de posses, é seguro que em pouco tempo ele estará
livre. Todos aqui podem ser subornados. Um homem pode tornar-se marujo ou
médico, ou assumir qualquer outra profissão, se puder pagar o suficiente. Foi
asseverado com gravidade por brasileiros que a única falha que eles encontraram
nas leis inglesas foi a de não poderem perceber que as pessoas ricas e
respeitáveis tivessem qualquer vantagem sobre os miseráveis e os pobres.”
Segundo consta, nem mesmo o mais alto tribunal do
Império permaneceu isento de corrupção. Em declaração ao Visconde de Sinimbu,
D. Pedro II desabafou:
“A primeira necessidade da magistratura é a
responsabilidade eficaz; e enquanto alguns magistrados não forem para a cadeia,
como, por exemplo, certos prevaricadores muito conhecidos do Supremo Tribunal
de Justiça, não se conseguirá esse fim”. [22]
O período republicano
A Constituição de 1891, ao dispor sobre o Poder Judiciário, estabeleceu expressamente, mas tão-só para os juízes federais, a garantia de vitaliciedade, determinando ainda que “os seus vencimentos serão determinados por lei e não poderão ser diminuídos” (art. 57, caput e § 1º). Tal norma deixava supor que essas garantias constitucionais não seriam necessariamente aplicáveis à magistratura estadual; o que felizmente foi afastado.
A Constituição de 1891, ao dispor sobre o Poder Judiciário, estabeleceu expressamente, mas tão-só para os juízes federais, a garantia de vitaliciedade, determinando ainda que “os seus vencimentos serão determinados por lei e não poderão ser diminuídos” (art. 57, caput e § 1º). Tal norma deixava supor que essas garantias constitucionais não seriam necessariamente aplicáveis à magistratura estadual; o que felizmente foi afastado.
Durante os governos militares de Deodoro e Floriano,
houve grande pressão política para submeter os julgamentos do novo Supremo
Tribunal Federal ao poder de controle final do Senado. Como a Carta Política
estabelecera, à imagem da Constituição norte-americana, a competência do Senado
Federal para julgar os Ministros do Supremo em caso de impeachment,
sustentou-se que, mesmo fora dessa hipótese, caberia àquele órgão político
rever as decisões da mais alta Corte de Justiça. Essa opinião absurda recebeu
longa e profunda refutação por parte de Rui Barbosa, em seu discurso de posse
do lugar de sócio do Instituto dos Advogados, na sessão de 11 de maio de
1911.[23] Ela foi, afinal, abandonada.
Registre-se, porém, a conclusão desalentadora de João
Mangabeira sobre atuação do Supremo Tribunal Federal, desde sua instituição até
o início do Estado Novo getulista em 1937: [24]
“O órgão que a Constituição criara para seu guarda
supremo, e destinado a conter, ao mesmo tempo, os excessos do Congresso e as
violências do Governo, a deixava desamparada nos dias de risco ou de terror,
quando, exatamente, mais necessitada estava ela da lealdade, da fidelidade e da
coragem dos seus defensores.”
Registre-se ainda que durante a República Velha, com
apoio nas ideias federalistas, a dominação de fato dos potentados locais (os
famosos “coronéis”) sobre os magistrados recrudesceu enormemente.
A Constituição de 1934, que vigorou apenas por três
anos, acrescentou em benefício dos magistrados, além da vitaliciedade e
irredutibilidade de vencimentos, também a garantia da inamovibilidade, sem
fazer distinções entre juízes ou tribunais federais e estaduais (art. 64).
Dispôs, contudo, que “os juízes, ainda que em disponibilidade, não podem
exercer qualquer outra função pública, salvo o magistério e os casos previstos
na Constituição”; acrescentando que “a violação deste preceito importa a perda
do cargo judiciário e de todas as vantagens correspondentes” (art. 65).
A Constituição de 1946 estabeleceu para os magistrados
em geral, além das três garantias acima citadas, a determinação de que “a
aposentadoria será compulsória aos setenta anos de idade ou por invalidez
comprovada, e facultativa após trinta anos de serviço público, contados na forma
da lei” (art. 95).
Instaurado o regime de exceção empresarial-militar com
o golpe de Estado de 1964, manteve-se pro forma a vigência do ordenamento
constitucional, com a supressão de fato das liberdades e garantias individuais,
bem como dos direitos sociais. Em 13 de dezembro de 1968, o chamado Ato
Institucional nº 5 emasculou a magistratura, ao decretar a suspensão oficial
das garantias constitucionais ou legais de vitaliciedade, inamovibilidade e
estabilidade (art. 6º), além de oficializar a suspensão do habeas corpus “nos
casos de crimes políticos contra a segurança nacional, a ordem econômica e
social e a economia popular” (art. 10). Isto quanto à Justiça Civil, pois a
Justiça Militar, durante toda a duração do regime autoritário, colaborou vergonhosamente
na repressão dos opositores políticos.[25]
Extinto o regime autoritário, foi promulgada em 1988 a
Constituição Federal em vigor, a qual regulou o Poder Judiciário com muito
maior amplitude do que todas as anteriores.
Aliás, já na fase final do regime autoritário,
exatamente em 14 de março de 1979, foi editada a Lei Complementar nº 35,
instituindo a Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Entre outras disposições,
essa lei criou o Conselho Nacional da Magistratura. Em 1998, porém, em simples
despacho de um de seus Ministros, o Supremo Tribunal Federal julgou-o extinto,
em razão da superveniência àquela Lei Complementar da Constituição Federal de
1988, a qual nada dispunha a respeito do mencionado Conselho. Ele foi, afinal,
ressuscitado, doravante sob a denominação de Conselho Nacional de Justiça, pela
Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004.
A criação desse órgão de controle da magistratura
veio, sem dúvida, atender à necessidade – longamente sentida desde o período
colonial, como lembrado acima – de se estabelecer um regime de responsabilidade
mais amplo e preciso dos magistrados. A reação destes à criação do novo órgão
foi, porém, desde logo muito negativa. Antes mesmo de sua publicação oficial, a
Emenda nº 45 foi objeto de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3367),
proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros. O Supremo Tribunal
Federal, embora afastando por unanimidade o vício formal da
inconstitucionalidade, decidiu tão-só por maioria julgar improcedente a ação em
sua totalidade.
Assinale-se, por fim, como evento significativo de um
começo de mudança na mentalidade conservadora de nossos magistrados, a fundação
em 13 de maio de 1991 da Associação Juízes para a Democracia. Ela tem como
objetivos estatutários a defesa do regime democrático de direito, fundado na
dignidade da pessoa humana, a democratização interna do Poder Judiciário, bem
como a valorização das funções jurisdicionais como autêntico serviço público,
isto é, serviço ao povo.
–
NOTAS
[14] História Geral da Civilização Brasileira, II – O Brasil Monárquico, 5 Do Império à República, São Paulo (Difusão Europeia do Livro), 1972, pág. 21.
[15] Apud Joaquim Nabuco, Um Estadista do Império, Rio de Janeiro (Editora Nova Aguilar), 1975, pág. 233.
[16] Vejam-se, a esse respeito as Memórias de um Magistrado do Império, do Conselheiro Albino José Barbosa de Oliveira (Companhia Editora Nacional, Coleção Brasiliana vol. 231, 1943, pp. 246 e ss.), o qual foi desembargador em dois tribunais da relação e tornou-se, no fim da vida, conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça
[17] Eis porque o velho Nabuco, em discurso na Câmara, propôs fosse suprimida a competência do júri para julgar tais crimes. Cf. Joaquim Nabuco, Minha Formação, Editora 34, 2012, pp. 171/172.
[18] Voyage dans les Provinces de Saint-Paul et de Sainte-Catherine, tomo primeiro, Paris (Arthus Bertrand, Libraire-Éditeur), 1851, pág. 138
[19] Obra publicada pela Editora Itatiaia Limitada, em colaboração com a Editora da Universidade de São Paulo, 1975, pág. 157.
[20] Notas sobre o Rio de Janeiro e Partes Meridionais do Brasil, Editora da Universidade de São Paulo – Livraria Itatiaia Editora Ltda., 1975, pág. 321.
[21] O Diário do Beagle, Editora UFPR, 2006, pág. 100.
[22] Apud José Murilo de Carvalho, D. Pedro II – Ser ou Não Ser, Companhia das Letras, 2007, pág. 83.
[23] Rui Barbosa, Escritos e Discursos Seletos, Rio de Janeiro, Companhia Aguilar Editora, 1966, pp. 548 e ss.
[24] Rui, O Estadista da República, Coleção Documentos Brasileiros nº 40, Livraria José Olympio Editora, 1943, pág.78.
[25] Veja-se a esse respeito o estudo de Anthony W. Pereira, Political (In)Justice – Authoritarianism and the Rule of Law in Brazil, Chile, and Argentina, University of Pittsburgh Press, 2005; cuja edição brasileira foi publicada sob o título Ditadura e Repressão – O autoritarismo e o estado de direito no Brasil, no Chile e na Argentina, Paz e Terra, 2010. Nesse estudo, enfatiza-se que, enquanto no Chile e na Argentina o Poder Judiciário foi claramente afastado do sistema repressivo, entre nós os órgãos da Justiça Militar não tiveram dificuldade alguma em colaborar com a repressão.
NOTAS
[14] História Geral da Civilização Brasileira, II – O Brasil Monárquico, 5 Do Império à República, São Paulo (Difusão Europeia do Livro), 1972, pág. 21.
[15] Apud Joaquim Nabuco, Um Estadista do Império, Rio de Janeiro (Editora Nova Aguilar), 1975, pág. 233.
[16] Vejam-se, a esse respeito as Memórias de um Magistrado do Império, do Conselheiro Albino José Barbosa de Oliveira (Companhia Editora Nacional, Coleção Brasiliana vol. 231, 1943, pp. 246 e ss.), o qual foi desembargador em dois tribunais da relação e tornou-se, no fim da vida, conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça
[17] Eis porque o velho Nabuco, em discurso na Câmara, propôs fosse suprimida a competência do júri para julgar tais crimes. Cf. Joaquim Nabuco, Minha Formação, Editora 34, 2012, pp. 171/172.
[18] Voyage dans les Provinces de Saint-Paul et de Sainte-Catherine, tomo primeiro, Paris (Arthus Bertrand, Libraire-Éditeur), 1851, pág. 138
[19] Obra publicada pela Editora Itatiaia Limitada, em colaboração com a Editora da Universidade de São Paulo, 1975, pág. 157.
[20] Notas sobre o Rio de Janeiro e Partes Meridionais do Brasil, Editora da Universidade de São Paulo – Livraria Itatiaia Editora Ltda., 1975, pág. 321.
[21] O Diário do Beagle, Editora UFPR, 2006, pág. 100.
[22] Apud José Murilo de Carvalho, D. Pedro II – Ser ou Não Ser, Companhia das Letras, 2007, pág. 83.
[23] Rui Barbosa, Escritos e Discursos Seletos, Rio de Janeiro, Companhia Aguilar Editora, 1966, pp. 548 e ss.
[24] Rui, O Estadista da República, Coleção Documentos Brasileiros nº 40, Livraria José Olympio Editora, 1943, pág.78.
[25] Veja-se a esse respeito o estudo de Anthony W. Pereira, Political (In)Justice – Authoritarianism and the Rule of Law in Brazil, Chile, and Argentina, University of Pittsburgh Press, 2005; cuja edição brasileira foi publicada sob o título Ditadura e Repressão – O autoritarismo e o estado de direito no Brasil, no Chile e na Argentina, Paz e Terra, 2010. Nesse estudo, enfatiza-se que, enquanto no Chile e na Argentina o Poder Judiciário foi claramente afastado do sistema repressivo, entre nós os órgãos da Justiça Militar não tiveram dificuldade alguma em colaborar com a repressão.