15.11.2015
Desde que a guerra na Síria demonstrou a
inferioridade do armamento dos EUA comparado ao da Rússia, a questão do fim da
hegemonia americana deve ser revista. De acordo com Rostislav Ischenko,
Washington precisa rapidamente tomar as decisões certas. Se Washington não
conseguir superar suas próprias divisões imediatamente, perderá o controle dos
eventos.
Rostislav Ischenko
O paradoxo da atual crise global é que, nos
últimos cinco anos, todas as Nações relativamente responsáveis e independentes
têm feito esforços tremendos para salvar os Estados Unidos do desastre
financeiro, econômico, militar e político que avulta. E isto apesar dos
movimentos igualmente sistemáticos de Washington para desestabilizar a ordem
mundial, corretamente conhecida como a "Pax Americana" ("paz
americana").
Desde que a política não é um jogo de soma-zero,
isto é, perda de um dos participantes não implica necessariamente em ganho para
o outro, este paradoxo tem uma explicação lógica. Uma crise surge dentro de
qualquer sistema quando há uma discrepância entre a sua estrutura interna e a
soma total dos recursos disponíveis (ou seja, aqueles recursos eventualmente
provarão ser inadequados para o sistema funcionar normalmente e como de
costume).
Há pelo menos três opções básicas para lidar com
esta situação:
Através da reforma, quando a estrutura interna do sistema evolui de forma a melhor corresponder aos recursos disponíveis.
Através do colapso do sistema, quando o mesmo resultado é alcançado através da revolução.
Através da preservação, quando os 'inputs' [entradas, dados] que ameaçam o sistema são eliminados pela força, e as relações dentro do sistema são cuidadosamente preservadas numa base de relação desigual (seja entre classes, estratos sociais, castas ou nações).
Através da reforma, quando a estrutura interna do sistema evolui de forma a melhor corresponder aos recursos disponíveis.
Através do colapso do sistema, quando o mesmo resultado é alcançado através da revolução.
Através da preservação, quando os 'inputs' [entradas, dados] que ameaçam o sistema são eliminados pela força, e as relações dentro do sistema são cuidadosamente preservadas numa base de relação desigual (seja entre classes, estratos sociais, castas ou nações).
O método de preservação foi tentado pelas dinastias
Ming e Qing na China, bem como a de Tokugawa Shogunate no Japão. Foi utilizado
com sucesso (no século XIX) antes da era da globalização capitalista. Mas,
nenhuma dessas civilizações orientais (embora bastante robustas internamente)
sobreviveu à sua colisão com a civilização européia, tecnologicamente mais
avançada (e, portanto, mais militarmente e politicamente poderosa). O Japão
encontrou sua resposta no caminho da modernização (reforma) na segunda metade
do século XIX, a China passou um século imersa no pântano da dependência
semi-colonial e sangrentas guerras civis, até que a nova liderança de Deng
Xiaoping foi capaz de articular sua própria visão de reformas de modernização.
Este ponto nos leva à conclusão de que um
sistema pode ser preservado somente se ele estiver protegido contra qualquer
influência externa indesejada, ou seja, se ele controlar o mundo globalizado.
A contradição entre o conceito de escapar da
crise, que tem sido adotada pela elite dos EUA, e o conceito alternativo -
proposto pela Rússia e apoiado pela China, em seguida, pelas outras nações do
grupo BRICS, e, agora, uma grande parte do mundo - baseia-se no fato de que os
políticos em Washington tomaram decisões a partir da premissa de que eles
seriam capazes de totalmente controlar o mundo globalizado e orientar o seu
desenvolvimento na direção que eles desejassem. Portanto, face à falta de
recursos para sustentar os mecanismos que perpetuassem a sua hegemonia global,
eles tentaram resolver o problema suprimindo energicamente os potenciais
adversários para realocar recursos globais a seu favor.
Se tivessem sidos bem-sucedidos, os Estados
Unidos teriam sido capazes de reprisar os acontecimentos do final da década de
1980-início da década de 1990, quando o colapso da União Soviética e do sistema
socialista global sob o seu controle permitiu que o oeste escapasse da crise.
Nesta nova fase, a questão é que não se trata simplesmente de realocar recursos
a favor do Ocidente como um todo coletivo, mas unicamente a favor dos Estados
Unidos. Esta mudança ofereceu ao sistema uma pausa que poderia ser usada para
criar um regime para preservar relações desiguais, durante a qual o controle
definitivo da elite americana sobre os recursos de energia, matérias-primas,
finanças, e recursos industriais salvaguardá-la-ia do perigo de implosão
interna do sistema, enquanto a eliminação de centros de poder alternativo
protegeria o sistema de violações externas, tornando-o eterno (pelo menos por
um período historicamente previsível).
A abordagem alternativa postulou que a
totalidade dos recursos do sistema poderia ser esgotada antes que os Estados
Unidos conseguissem gerar os mecanismos para perpetuar sua hegemonia global.
Por sua vez, isso vai levar à tensão (e distensão) das forças que garantem a
repressão imperial das nações existentes na periferia global, para o benefício
do centro baseado em Washington, o que mais tarde suscitará o inevitável
colapso do sistema.
Duzentos, ou mesmo cem anos atrás, os políticos
teriam agido sob o princípio de que "o que está caindo, deve-se também
empurrar" e se preparado para distribuir a herança de outro império em
ruínas. No entanto, a globalização não só da indústria e do comércio mundial
(que foi alcançada no final do século XIX), mas também a finança global, provocou
o colapso do império americano através de uma política extremamente perigosa e
cara para todo o mundo. Falando sem rodeios, os Estados Unidos poderiam ter
enterrado a civilização sob seus próprios destroços.
Consequentemente, a abordagem russo-chinesa fez
questão de oferecer a Washington uma opção de compromisso que endossa a erosão
gradual, evolutiva da hegemonia americana, além da reforma incremental das
relações internacionais financeiras, econômicas, militares e políticas com base
no atual sistema de direito internacional.
A possibilidade de uma "aterragem
suave" foi oferecida à elite dos Estados Unidos da América [1], a
qual preservaria a grande parte da sua influência e ativos, enquanto
gradualmente adaptando o sistema para melhor corresponder aos presentes fatos
da vida (alinhando-o à reserva de recursos disponíveis), levando em conta os
interesses da humanidade e não apenas de seu "escalão superior", como
exemplificado pelas "300 famílias" que estão na verdade diminuindo
para não mais de trinta.
No final, é sempre melhor negociar do que
construir um mundo novo sobre as cinzas do velho. Especialmente porque houve um
precedente global de acordos semelhantes.
Até 2015, a elite dos EUA (ou pelo menos aqueles
que determinam a política dos EEUU) tinha certeza de que possuía força
financeira, econômica, militar e política suficiente para paralisar o resto do
mundo, preservando a hegemonia de Washington enquanto privando todos, incluindo
(em sua fase final) mesmo o povo americano, de qualquer soberania política real
ou direitos econômicos. Os burocratas europeus foram importantes aliados para
essa elite - ou seja, o setor da burguesia cosmopolita, compradora da elite da
UE, cujo bem-estar dependia de uma maior integração transatlântica (isto é, sob
controle dos Estados Unidos) das entidades da UE (em que a premissa da
solidariedade atlântica tornou-se dogma geopolítico) e da OTAN, embora isto
estivesse em conflito com os interesses dos membros da União Europeia.
No entanto, a crise na Ucrânia, que se arrasta
muito mais do que o inicialmente previsto, o impressionante surto de energia
política e militar da Rússia ao mobilizar-se para resolver a crise Síria [
Mas, os EEUU precisam pensar rápido. Seus
recursos estão encolhendo muito mais rápido do que os autores do plano de
preservação imperial tinham esperado. À sua perda de controle dos países do
BRICS pode ser adicionada a incipiente mas ainda razoavelmente rápida perda de
controle sobre a política da UE, bem como o início das manobras geopolíticas
entre as monarquias do Oriente Médio. As entidades financeiras e econômicas
criadas e postas em marcha pelas nações do grupo BRICS estão a desenvolver-se
em conformidade com a sua própria lógica, e Moscou e Pequim não serão capazes
de retardar seu desenvolvimento enquanto aguardam que os EEUU descubram de
repente sua capacidade de negociação.+
O ponto de não retorno vai passar de uma vez por
todas em 2016, e depois disso a elite dos EUA já não mais será capaz de
escolher entre as disposições do compromisso e do colapso. A única coisa que
ela então será capaz de fazer será bater a porta ruidosamente, tentando
arrastar o resto do mundo atrás de si para o abismo.
Rostislav
Ischenko
http://www.voltairenet.org/article189253.html
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http://port.pravda.ru/mundo/15-11-2015/39802-pax_americana-0/#sthash.vsAbx2Eq.dpuf
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