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sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Mali: vozes de discórdia no meio da reconquista

 
 
  
Imagen activaHavana (Prensa Latina) A intervenção de tropas francesas no Mali abre um novo capítulo da presença europeia na África que, para especialistas, é a mesma fórmula aplicada pelas ex-metrópoles durante séculos nas antigas colônias para saquear suas riquezas naturais.
Esta nova aventura militar, justificada agora por Paris com as chamadas "ajuda humanitária" e "guerra contra o terrorismo", começa a ter opositores apesar da complacência com a qual foi aceita pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, pela União Africana e por parte da comunidade mundial.

O próprio secretário geral da ONU, Ban Ki-moon, considerou o tema de alta prioridade devido à "ameaça dos insurgentes armados" e parabenizou a decisão do mandatário francês, Francois Hollande, de enviar tropas a território malinês contra o avanço dos insurgentes no sul.

Ban Ki-moon afirmou que essa ajuda deve estar guiada pelas orientações da ONU para cumprir com os objetivos militares de restabelecer a ordem constitucional e a legitimidade política do Mali.

Esta intervenção reforça a doutrina ocidental de guerra liderada pelos Estados Unidos no mundo e poderia ser o pretexto das antigas metrópoles para reiniciar a reconquista da África, em um momento no qual a Europa está pressionada pela crise econômica.

As fontes estimam que esse país é vítima de uma tentativa dos poderes ocidentais de "intensificar seu domínio sobre os recursos e economias" africanas, cheio de cobiçadas riquezas naturais como ouro, petróleo, diamantes e o estratégico coltan.

Se a Europa conseguir reforçar as capacidades de reconquista no norte malinês mediante essa operação armada, então "será uma conquista real da defesa europeia", consideram fontes do chamado Velho Continente.

VOZES DE DISCÃ"RDIA

Enquanto os Estados Unidos, o Canadá e a Europa apoiam politicamente e com logística a intervenção, que já vai por sua segunda semana e poderia se estender no tempo, aumentam os questionamentos e críticas.

A presença de dois mil 300 militares franceses e a possibilidade de que essa cifra se duplique nos próximos dias revela que a campanha não anda muito bem ou que sua verdadeira intenção, apesar das declarações de autoridades e funcionários públicos franceses, difere das palavras.

As crescentes críticas provém da própria França, onde políticos questionaram a operação militar, iniciada de maneira inesperada por Hollande, ainda que de certa maneira já se via no horizonte mais distante.

Jean-Luc Mélenchon, chefe da Frente de Esquerda, arremeteu contra a decisão do governo ao dizer que "estamos no Mali porque não podemos permitir que outros países da região, e portanto a extração de urânio da qual dependem as centrais francesas, corram perigo".

Sublinhou que o objetivo de Hollande é defender os interesses de Paris na África, especialmete na Nigéria, rica em urânio.

Mélenchon, ex-candidato à presidência francesa, defendeu o "direito a saber a verdade" sobre uma guerra que custa dois milhões de euros por dia em um período de austeridade.

Questionou também o fato da intervenção ter sido ordenada sem consultar antes o Governo e o Parlamento, em uma decisão que, segundo ele, "tem muitos pontos obscuros".

O ex-premiê conservador Alain Juppé, da União por um Movimento Popular, disse ter a impressão de que a França não poderá cumprir sozinha com a tarefa de intervenção.

"Queria que a posição francesa fosse esclarecida", disse Juppé, já que "tenho a impressão de que hoje está dedicada a uma reconquista geral do território".

Outra voz de discórdia foi a de Noel Mamore, do partido Europa Ecologia Os Verdes, ao afirmar que a operação Serval (assim chamada na França) é uma manobra neocolonialista.

As principais críticas no país se referem à falta de preparação da operação militar, à possibilidade de estancamento em um conflito de longa duração ou à violação do que foi estabelecido inicialmente pelo Conselho de Segurança.

Para o analista Juan Luis González, os interesses geopolíticos das antigas metrópoles da África são a principal razão da chegada de tropas francesas a Mali, onde depois chegaram tropas da Espanha, Alemanha, Bélgica, Itália, Reino Unido e outros estados europeus.

Considera que o verdadeiro objetivo da presença francesa neste país africano em sua luta contra os islâmicos é controlar seus recursos, em um operativo que qualificou de "cortina de fumaça".

Há um montão de minérios a serem explorados em território malinês, afirmou.

O embaixador de Angola na Etiópia e na União Africana, Arcanjo do Nascimento, afirmou que a fragilidade das instituições nos Estados africanos constitui a base de numerosos conflitos no continente.

Outras causas desses problemas são também a polarização social e a ingerência estrangeira em assuntos internos dos países africanos, sublinhou, e fez um chamado a que soluções africanas sejam apresentadas a estas problemáticas.

Forças progressistas e nacionalistas, entre elas a Coordenadora de Organizações Patrióticas de Mali, se opuseram à intervenção, e o Partido Argelino para a Democracia e o Socialismo considerou que a presença de um contingente estrangeiro armado pode funcionar como uma cortina que beneficia potências colonialistas, enquanto promove conflitos entre os africanos.

AJUDA HUMANITÁRIA OU RECONQUISTA DA ÁFRICA?

Olhar para os enormes recursos minerais e energéticos existentes nesse país africano bastaria para descobrir os verdadeiros motivos da França e seus aliados por trás desta intervenção armada.

O Estado africano é o terceiro maior produtor de ouro do continente, com oito minas em exploração, e é famoso por isso desde a época do grande império, apontam os pesquisadores de Global Research.

Além disso, dispõe de urânio, indispensável para o funcionamento das centrais nucleares; e recentemente foram descobertas novas jazidas de urânio em várias províncias, principalmente as de Gao e Kidal, ao norte, ocupadas por povos islâmicos desde maio de 2012.

Mali também pode ser convertido em fornecedor de petróleo e gás para a Europa, e conta com reservas comprovadas de diamante, ferro, bauxita e manganês (estes últimos ainda não explorado), cobre, gesso, mármore e outros minérios, segundo fonte citada.

A intervenção militar francesa no Mali coloca em perigo as enormes riquezas patrimoniais na província de Tumbuctú, também no norte, incluída desde 1988 na lista de Patrimônios Históricos da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Construída no meio do deserto e rodeada de lendas, esta cidade foi fundada entre os séculos XI e XII por tribos nômades berberes ou tuaregues procedentes do norte, alberga importantes valores culturais, e chegou a ser um importante centro de comércio e próspera cidade no século XVI, qualificado como sua era de ouro.

O fato de extremistas islâmicos terem destruído alguns monumentos e santuários que consideraram ofensivos para sua religião gerou uma onda de reações internacionais, que a França aproveitou a favor de suas pretensões, materializadas agora com a intervenção em curso.

*Chefe da redação África e Oriente Médio da Prensa Latina.

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