A crise sistêmica do capitalismo entra na sua fase de
putrefação, as conjunturas políticas e econômicas dos continentes e das
nações sofrem mudanças, os efeitos sobre os povos são devastadores.
Por Erman Dovis*, em Marx21
Na Síria, depois de ter fomentado e gerado uma situação de extremo caos, depois de ter armado bandos mercenários, fornecido cobertura logística e militar, exercendo o total controle da mídia ocidental, o imperialismo se apresta a desencadear a enésima guerra de agressão, com pouquíssima distância da matança criminosa realizada com danos para o povo líbio.
Os grandes capitalistas e os monopólios privados impõem o uso do extraordinário potencial militar do Pentágono e da Otan, autênticos braços armados que ameaçam, agridem, balcanizam os Estados, causando enormes sofrimentos às populações. Os imperialistas marcham de maneira forçada rumo à realização de seu projeto neocolonialista, e o intervalo entre uma agressão militar e outra se reduz cada vez mais. A isto acrescem as intrigas, a desesabilização, o fomento de ações para derrubar governos democraticamente eleitos, como está acontecendo na América Latina, onde se assiste a um retorno de ingerências agressivas, na maior parte provenientes dos norte-americanos.
A ação e a prática unitária dos governos progressistas, (Brasil, Bolívia, Argentina, Venezuela, Equador, Cuba, Uruguai, Nicarágua...) que perseguem objetivos comuns de interesse social e a independência nacional, reduz espaço aos negócios das multinacionais que buscam com insistência sempre maior o retorno aos períodos de absoluto domínio econômico do passado recente.
A política de destruição das forças produtivas e de açambarcamento dos recursos, ocorre também na Europa, sob um plano de ataque geral ao Estado Social, aos direitos conquistados, às Constituições democráticas. Os monopólios, através da criação de seus próprios organismos como o Banco Central Europeu e a União Europeia, impõem uma submissão geral das nações e dos governos, reféns dos interesses e dos potentados econômicos que chegam a privatizar todo o Estado, que se transforma em um simples comitê de negócios. Hoje o modo de produção capitalista é de caráter monopolista-financeiro, e na atual fase o Estado desaparece na empresa monopolista, tornando-se um simples elemento da produção, sem nenhuma possibilidade de mediação, como acontecia há não muito tempo. Pelo menos neste âmbito, podemos definir como concluída a época da terceirização política.
No concreto, isto comporta uma selvagem requisição de dinheiro que se manifesta através da liquidação do Estado Social, cortes salariais, privatização de bens e serviços, desemprego em massa, aumento e introdução de novos impostos, e também a aquisição dos bens da burguesia produtiva, que fica espremida e falida e manifesta com frequência cada vez maior o seu desconforto. Os povos da Grécia, França, Espanha, Itália, Portugal sofrem um ataque de uma violência inaudita, vivemos e tocamos com as mãos o verdadeiro desespero.
As formações monopolistas têm assumido uma veste multinacional, os seus interesses abarcam numerosos setores, apesar de diferentes entre si, e não especificamente mercadológicos. O capital se concentra cada vez mais em poucas mãos, centralizando-se não mais em nível nacional, mas quando menos europeu, razão pela qual a resposta que os comunistas devem dar deve ser de caráter continental. É necessário trabalhar para se desprender da dependência econômica dos monopólios, para relançar as nacionalizações e o setor público: uma recuperação da soberania nacional no âmbito de um processo unitário europeu.
Enquanto as políticas econômicas europeias geradas pela busca do lucro máximo espremem e lançam ao desespero os povos, a brutal concorrência por mercados gera profundos contrastes que abalam os grandes capitalistas da União Europeia: de uma parte, tentam fortalecer e estabilizar a atual fase política, através da instituição de organismos privados intergovernamentais e, de outra, a própria União Europeia é confrontada internamente com ferozes tensões. Uma luta feroz, por exemplo, se desenvolve entre os governos da Bélgica, Holanda, Luxemburgo e Reino Unido para atrair capitais offshore, graças às jurisdições secretas dos regimes fiscais desses países.
Mas isto é só um aspecto. A tentativa de compor a Europa capitalista no âmbito de um Estado federal, segundo as recentes declarações do presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, é um projeto que vem de longe, mas as profundas contradições intercapitalistas impedem esta passagem definitiva: em 1966 foram tais contradições que determinaram a saída da França da Otan, embora isto não tenha impedido uma estratégia comum contra a URSS, os Estados socialistas do Pacto de Varsóvia e os partidos comunistas da Europa ocidental. Em definitivo, sem prejuízo da estrutura capitalista, o Estado europeu não existirá jamais, porque como disse Lênin, são tubarões que se comem uns aos outros.
A Itália, prossegue o plano de demissões na indústria, para tornar o país cada vez mais exposto e economicamente dependente. Só quem não é afetado é o capital financeiro que se enriquece sobre a base de dinâmicas especulativas, enquanto são golpeadas a vida concreta e a dignidade de milhões de pessoas. As medidas assumidas pelo governo de Monti refletem uma condição dramática que mostra o governo e as instituições completamente a serviço do poder direto das formações monopolistas. A produção industrial caiu, o desemprego está em constante aumento chegando a pontos culminantes. A indústria do aço (Ilva, Thyssen-Krupp, Lucchini), a têxtil, a do alumínio, a dos produtos da linha branca mostram condições de mortalidade produtiva que levam o país para a dependência econômica do exterior.
O mercado automobilístico está em queda: a Fiat fechou o ano com 415 mil automóveis vendidos e realizando demissões em massa. Este dado permite prever facilmente uma definitiva reorganização industrial: 400 mil automóveis por ano, com a devida organização, podem ser tranquilamente produzidos em um só estabelecimento. E enquanto os trabalhadores são expulsos do ciclo produtivo, enquanto o investimento morre, os dados das vendas do grupo voam nos EUA, no Canadá, México e Brasil. Isto demonstra que o problema não é a inovação, como se diz por aí: o diminuto poder aquisitivo, determinado pela exploração capitalista e pela busca do lucro máximo, causa a drástica redução da produção e direciona os investimentos e a atividade para quem pode dispender.
Desde sua perspectiva de classe, o patrão Elkann não erra. Para fazer face às despesas, finalmente os capitães da indústria impõem a reforma do mercado de trabalho, fundamental para desembaraçar-se sem muito barulho dos trabalhadores considerados excedentes para livrar-se da vanguarda politizada e sindicalizada, e, finalmente, obter margens de lucro maiores. O que se vai delineando é um processo de americanização das relações industriais, para obter um modelo baseado unicamente em relações de força. De fato, recentemente o patrão John Elkann viajou a Melfi, levando consigo Sérgio Marchionne e o presidente do Conselho de Ministros Mario Monti. Elkann foi mostrar seu plano de classe, sua ameaça, seu rosnado para com a classe operária exatamente em Melfi, onde em 2004 se produziu uma das maiores batalhas operárias no plano europeu dos últimos trinta anos, uma disputa que ajoelhou Elkan e o governo de Berlusconi.
As contradições gerais hoje mostram que a classe operária italiana está em recuo. É uma situação objetiva de isolamento, de fragmentação, de constante ameaça e terrorismo a que somos submetidos. Há até mesmo quem fique com medo de se aproximar de uma banca de recolhimento de assinaturas para um abaixo-assinado, e isto ocorre por meio do cordão sanitário construído em torno dos trabalhadores, que os isola, expondo-os ao projeto de restauração. Isto automaticamente complica o trabalho dos comunistas. A divisão dos trabalhadores e a ausência do papel dirigente da classe operária em suas próprias organizações, fruto de longas estratégias revisionistas que hoje dão seus resultados, não permite um contraste eficaz com a cultura burguesa dominante, com o pensamento dominante.
Existe também outra dificuldade objetiva, ainda mais séria: reduzindo-se a presença operária e seu pensamento de classe, tomam impulso as reivindicações da pequena burguesia intelectualizada. Através de uma fraseologia ultrarrevolucionária e de extrema esquerda, o individualismo pequeno-burguês alimenta divisões, demolindo “pela esquerda” as experiências dos outros. Não tendo a capacidade de análise concreta da classe operária, mas somente retórica vazia, este desvio se exprime por meio de esquematismo e de palavras de ordem cativantes, imediatistas e atraentes, mas ilusórias e devastadoras para os comunistas e os trabalhadores. O individualismo intelectual do pequeno-burguês se manifesta por exemplo na presunção de ser autossuficiente, na alta consideração de si mesmo, na absoluta convicção de que suas próprias ideias podem substituir a análise dialética, no desprezo ao companheiro de luta, na criação do caos e da confusão.
É nestas condições dramáticas que se encontram atuando a classe operária e os comunistas, enquanto o país se prepara para as próximas eleições. Sem papas na língua, o capitalismo monopolista pretende estabilizar o quadro político dentro de uma ótica reacionária, subsumir definitivamente o Estado e as instituições, liquidar o Estado Social e a representação democrática, impedir a todo custo qualquer retardamento de tal projeto (mesmo que através de um impasse entre as duas casas legislativas), revogar a Constituição republicana nascida da Resistência antifascista.
O retorno de Berlusconi, a “saída” de Monti, o apoio a este da parte de Montezemolo e do Vaticano correspondem precisamente a estas exigências. Obviamente as tensões existentes entre o ex-premiê e o atual, são contrastes secundários com respeito ao plano comum dirigido contra os trabalhadores, as massas populares e a própria burguesia. É preciso deter Monti e Berlusconi.
A política não é exercício intelectual, mas é luta de classe, mesmo nas competições eleitorais.
Os comunistas devem saber sempre distinguir a contradição principal da secundária, ter, com base nisso, a capacidade de modificar a estratégia e a tática de acordo com as mudanças na situação e trabalhar para construir a mais ampla concertação de forças para desarticular o inimigo principal. Inclusive aliando-se, em certas situações, em certas circunstâncias, com o inimigo secundário. Na fase atual, os comunistas buscarão romper com todos os meios o cerco e a condição de isolamento a que foram submetidos, favorecendo a máxima convergência das forças políticas disponíveis a conduzir a oposição ao montismo [de Mário Monti] e ao berlusconismo [de Berlusconi], convergência materializada na lista eleitoral Revolução Civil.
Os comunistas, no âmbito dessa coalizão de forças, levarão adiante a batalha em favor dos direitos dos trabalhadores e das massas populares, pelo direito ao trabalho, contra a guerra, pela paz e a amizade entre os povos. Este é um importante percurso de acumulação de forças, ainda necessária para manter aberta a perspectiva de luta pelo socialismo. Recordando sempre que a condição insubstituível para o fortalecimento e a reconstrução do Partido é o retorno ativo, criativo, protagonista e dirigente da classe operária. Quando os trabalhadores e as massas populares irrompem na cena política, as tendências pequeno-burguesas recuam, a luta toma corpo, cria-se a verdadeira unidade e os governos reacionários podem ser batidos. O inimigo de classe pode ser derrotado.
*Membro do Comitê Central do Partido dos Comunistas Italianos (PdCI); publicado em www.marx21.it/index.php
Tradução do italiano por José Reinaldo Carvalho
Fonte: Vemelho
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