Segundo André Singer, a prisão do
ex-presidente do PT ocasionaria "imagem forte para a posteridade" e diz
que houve exageros na condenação
247 - Autor de estudos sobre o
"lulismo", o cientista político André Singer argumenta, em artigo na
Folha, que o julgamento de José Dirceu atropelou garantias
constitucionais e pede a revisão de sua pena. Diz ainda que um dos
objetivos da prisão, em regime fechado, é ocasionar "imagem forte para a
posteridade". Leia:
Rever a pena
A rigor, seria preciso aguardar o fim da ação penal 470
para iniciar a análise de conjunto que o assunto requer. Se às
autoridades cabe acatar os vereditos do STF, que para tanto é soberano, à
opinião pública -ou o que dela resta em tempos de acelerada
massificação- cumpre discutir com autonomia e desassombro as conclusões
proferidas pelo tribunal.
No entanto, em face da inopinada inversão de pauta operada
pelo relator, que resultou em sentença de alto impacto político na
segunda-feira passada, impõe-se avaliar de imediato a pena de dez anos e
dez meses aplicada a José Dirceu. Sobretudo pela desproporção deste
ficar recluso pelo menos um ano e nove meses em penitenciária de
segurança máxima.
O respeito ao Estado de direito garantiu ampla liberdade e
independência ao procurador e aos juízes -assim como aos advogados de
defesa, diga-se- no decurso dos trabalhos. Tal apego às regras, e também
ao contraditório no andamento dos debates televisionados, conferiu
legitimidade às decisões da corte. A dosimetria aplicada ao ex-chefe da
Casa Civil, contudo, modificou a imagem projetada pelo Supremo.
Tendo inegável papel na história do PT, a prisão do
ex-presidente da sigla atingirá o partido, ocasionando imagem forte para
a posteridade. A suspeita que paira é se o exagero punitivo não mirou
tal alvo, distorcendo, assim, a finalidade do processo. Isto é, se, no
caso, os preceitos de equilíbrio e razoabilidade foram deixados de lado
com o fito de ferir um símbolo partidário.
Note-se que a reclusão de Dirceu em regime fechado deriva
da soma de duas acusações, a decorrente de corrupção ativa e a
concernente à polêmica tese de formação de quadrilha. Caso tivesse sido
condenado apenas pela primeira -ela própria objeto de disputa sobre a
ausência de provas-, o líder petista teria direito à modalidade
semiaberta.
Acresce que o debate sobre o segundo tema dividiu a corte.
Não somente Lewandowski e Toffoli absolveram Dirceu, como também o
fizeram, nesse tópico, Rosa Weber e Cármen Lúcia. Esta última, que havia
realizado o ataque mais duro à argumentação do caixa dois quinze dias
antes, lembrou que quadrilheiros típicos eram Lampião e seu grupo, não
os envolvidos na AP 470.
O confronto de 22 de outubro no plenário do STF mostrou o
quanto, nas circunstâncias, há de duvidoso no su-posto crime de formação
de quadrilha, o qual, todavia, gerou uma pena (no item) quase máxima
para o acusado. Como o princípio do "in dubio pro reo" é fundamental no
espírito da Justiça, que não é o de retaliar, mas o de garantir o
acatamento da lei, faz-se necessário rever a punição imposta a José
Dirceu.
Brasil247
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