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sexta-feira, 7 de junho de 2013

Karl Marx: Conhecimento absoluto - O capítulo final da Fenomenologia


O ponto capital é o objeto da consciência nada mais ser do que autoconsciência, o objeto ser apenas autoconsciência objetificada, autoconsciência como um objeto. (Homem que postula = autoconsciência.)
É necessário, pois, vencer o objeto da consciência. A objetividade como tal é considerada apenas uma relação humana alienada não correspondente à essência do homem, a autoconsciência. A reapropriação da essência objetiva do homem, produzida como algo alheio ao homem e determinado pela alienação, significa a revogação não só da alienação mas também da objetividade; isto é, o homem é visto como um ser não-objetivo, espiritual.
A processo de superação do objeto da consciência é descrito por Hegel da seguinte maneira: o objeto não se revela apenas como retornando ao Eu (segundo Hegel, essa é uma concepção unilateral do movimento, considerando somente um aspecto). O homem e igualado ao eu. O Eu, no entanto, é apenas o homem concebido abstratamente e produzido por abstração. O homem é auto-referível. Seu olho, seu ouvido, etc., são auto-referíveis; todas as suas faculdades possuem essa qualidade de auto-referência. É inteiramente falso, todavia, dizer, por isso, "A autoconsciência tem olhos, ouvidos, faculdades." A autoconsciência é antes uma qualidade da natureza humana, do olho humano, etc.; a natureza humana não e uma qualidade da (XXIV) autoconsciência.
O Eu, abstraído e determinado por si mesmo, é o homem como um egoísta abstrato, egoísmo puramente abstrato elevado ao plano do pensamento. (Voltaremos a esse ponto mais adiante.)
Para Hegel, a vida humana, o homem, é equivalente a autoconsciência. Toda a alienação da vida humana é, assim, nada mais que alienação da autoconsciência. A alienação da autoconsciência não é vista como a expressão, refletida no conhecimento e no pensamento, da verdadeira alienação da vida humana. Ao invés, a alienação efetiva, que parece real, em sua mais íntima natureza oculta (que é pela primeira vez desvendada pela filosofia) é apenas a existência fenomenal da alienação da vida humana real, da autoconsciência. A ciência que abrange isso é, por conseguinte, denominada Fenomenologia. Toda reapropriação da vida objetiva alienada aparece, assim, como uma incorporação à autoconsciência. A pessoa que se apodera do ser humano é apenas a autoconsciência que se apodera do ser objetivo; a volta do objeto para dentro do Eu, portanto, é a reapropriação do objeto.
Expressa de maneira mais lata, a revogação do objeto da consciência significa: (1) que o objeto como tal se apresenta à consciência como algo que desaparece; (2) que é a alienação da autoconsciência que estabelece o característico de "coisa"; (3) que essa alienação tem significado positivo assim como negativo; (4) que ela tem esse significado não apenas para nós ou em si, mas também para a própria autoconsciência; (5) que para a autoconsciência a negação do objeto, sua revogação, tem significado positivo, ou a autoconsciência conhece a nulidade do objeto porquanto ela se aliena a si mesma, pois nessa alienação ela se estabelece como objeto ou, em prol da união indivisível de existir por si mesma, estabelece o objeto como ela própria; (6) que, por outro lado, esse outro "momento" está igualmente presente, a auto consciência revogou e reabsorveu essa alienação objetivamente, e está, assim, em casa em seu outro ser como tal; (7) que esse e o movimento da consciência, e esta é, então, a totalidade de seus "momentos"; (8) que, analogamente, a consciência deve ter-se relacionado com o objeto em todas as suas determinações, e tê-lo concebido em função de cada uma delas. Essa totalidade de determinações faz o objeto intrinsecamente, um ser espiritual, e ele se torna assim, deveras, para a consciência, pela apreensão de cada uma dessas determinações como o Eu, ou pelo que foi anteriormente chamado de atitude espiritual para com elas.
ad (1) Que o objeto como tal se apresenta à consciência como algo que desaparece, é a acima mencionada volta do objeto para o Eu.
ad (2) A alienação da autoconsciência estabelece o característico de "coisa". Porque o homem se iguala à autoconsciência, seu ser objetivo alienado ou "coisa" e equivalente à autoconsciência alienada, e essa alienação estabelece a situação de "coisa". ("Coisa" é o que é um objeto para ele, e um objeto para ele só é realmente aquilo que é um objeto essencial, consequentemente essência objetiva dele mesmo. E como ela não é o homem verdadeiro, nem sua natureza - o homem sendo natureza humana - que se torna como tal um sujeito, mas apenas uma abstração do homem, a autoconsciência, a "coisa" só pode ser autoconsciência alienada.) É bem compreensível um ser natural, vivo, dotado de faculdades objetivas (i. é, materiais) ter objetos naturais reais de seu ser, e igualmente sua auto-alienação ser o estabelecimento de um mundo objetivo, real, mas sob a forma de exterioridade, como um mundo que não pertence a, e domina, o seu ser. Nada há de ininteligível ou de misterioso acerca disso. O inverso, sim, seria misterioso. Mas, é igualmente claro que uma autoconsciência, i. é, sua alienação, só pode estabelecer a situação de "coisa", i. é, somente uma coisa abstrata, uma coisa criada pela abstração e não uma coisa real. É claro (XXVI), ademais, que a situação de "coisa" carece totalmente de independência, em ser, vis-à-vis, a autoconsciência; e um mero construto estabelecido pela autoconsciência. E o que é estabelecido não é confirmável por si mesmo; é a confirmação do ato de estabelecimento que, por um instante, e só por um instante, fixa sua energia como produto e, aparentemente, confere-lhe o papel de ser independente e real.
Quando o homem real, corpóreo, com os pés firmemente plantados no chão, aspirando e expirando todas as forças da natureza, postula suas faculdades objetivas reais, como resultado de sua alienação, como objetos alienados, o postulador não é o sujeito desse ato mas a subjetividade da faculdade objetiva cuja ação, pois, também deve ser objetiva. Um ser objetivo age objetivamente, e não agiria objetivamente se a objetividade não fizesse parte de seu ser essencial. Ele cria e estabelece apenas objetos porque é estabelecido por objetos e porque é fundamentalmente natural. No ato de estabelecer, não desce de sua "atividade pura" para a criação de objetos; seu produto objetivo simplesmente confirma sua atividade objetiva, sua atividade como ser natural, objetivo.
Vemos aqui como o naturalismo ou humanismo coerente se distingue tanto do idealismo como do materialismo e, ao mesmo tempo, constitui a sua verdade unificadora. Vemos, também, como só o naturalismo está em condições de compreender o processo da história mundial.
O homem é diretamente um ser natural. Como tal, e como ser natural vivo, ele é, de um lado, dotado de poderes e forças naturais, nele existentes como tendências e habilidades, como impulsos. Por outro lado, como ser natural, dota dotado de corpo, sensível e objetivo, ele é um ser sofredor, condicionado e limitado, como os animais e vegetais. Os objetos de seus impulsos existem fora dele como objetos dele independentes; sem embargo, são objetos das necessidades dele, objetos essenciais indispensáveis ao exercício e a confirmação de suas faculdades. O fato de o homem ser dotado de corpo, vivo, real, sensível e objetivo, com poderes naturais, significa ter objetos reais e sensíveis como objetos de seu ser, ou só poder expressar seu ser em objetos reais e sensíveis. Ser objetivo, natural, sensível e, ao mesmo tempo, ter objeto, natureza e sentidos fora de si mesmo, ou ser ele mesmo objeto, natureza e sentidos para um terceiro, é a mesma coisa. A fome é uma necessidade natural; ela exige, portanto, uma natureza a ela extrínseca, um objeto a ela extrínseco, a fim de ser satisfeita e aplacada. A fome e a necessidade objetiva que um corpo tem de um objeto existente fora dele e essencial para sua integração e a expressão de sua natureza. O sol é um objeto, um objeto necessário e assegurador de vida para a planta, tal como a planta é um objeto para o sol, uma expressão do poder vivificador e dos poderes essenciais objetivos do sol.
Um ser que não tenha sua natureza fora de si mesmo não é um ser natural e não compartilha da existência da natureza. Um ser sem objeto fora de si mesmo não é um ser objetivo. Um ser que não seja, ele próprio, o objeto para um terceiro ser, não possui ser para seu objeto, i. é, não é relacionado objetivamente e seu ser não é objetivo.
(XXVII) Um ser não-objetivo é um não-ser. Suponhamos um ser que não seja objeto por si mesmo nem tenha objeto. Em primeiro lugar, um ser assim seria o único ser; nenhum outro existiria fora dêle, e êle estaria sôzinho e solitário. Pois, desde que existam objetos fora de mim, logo que eu não esteja , sou um outro, uma outra realidade com relação ao objeto exterior a mim. Para êsse terceiro objeto, portanto, sou uma outra realidade, que não é, i. é, o objeto dele. Supor um ser que não é objeto de outro, seria supor não existir ser objetivo nenhum. Logo que tenho um objeto, êsse objeto tem a mim para objeto dêle. Um ser não-objetivo, porém, é um ser irreal, insensível, meramente concebido; i. e, um ser simplesmente imaginado, uma abstração. Ser sensorial, i. é, real, é ser um objeto dos sentidos ou objeto sensorial e, pois, ter objetos sensoriais fora de si mesmo, obje tos de suas próprias sensações. Ser sensível é sofrer (expe rienciar).
O homem, como ser sensível objetivo, é um ser sofredor, e como sente seu sofrimento, um ser apaixonado. A paixão é o esfôrço das faculdades do homem para atingirem seu objetivo.
Contudo, o homem não é apenas um ser natural; êle é um ser natural humano. Ele é um ser por si mesmo e, portanto, um ente-espécie; como tal, tem de expressar-se e autenticar-se ao ser assim como ao pensar. Consequentemente, os objetos humanos não são objetos naturais como se apresentam diretamente, nem é o sentido humano, como é dado imediata e objetivamente, sensibilidade e objetividade humanas. Nem a natureza objetiva nem a subjetiva são apresentadas diretamente de forma adequada ao ser humano. E como tudo o que é natural tem de ter uma origem, o homem tem então seu processo de gênese, a História, que é para êle, entretanto, um processo consciente e, portanto, conscientemente autotranscendente. (Voltaremos a isso mais tarde.)
Em terceiro lugar, como êsse estabelecimento da situação de "coisa" e em si mesmo so' mente uma aparência, um ato que contradiz a natureza da atividade pura, tem de ser novamente anulado e a situação de "coisa" tem de ser negada.

ad 3, 4, 5, 6. (3) Essa alienação da consciência não tem só significado negativo, mas também positivo, e (4) tem êsse significado positivo não apenas para nós ou em si mesma, mas para a própria consciência. (5) Para a consciência a negação do objeto, ou sua anulação de si mesmo por êsse meio, tem significado positivo; ela sabe da nulidade do objeto pelo fato de alienar-se a si mesma, porque nesta alienação ela se conhece como o objeto ou, em benefício da união indivisível do ser-para-si-mesmo, conhece o objeto como êle próprio. (6) Por outro lado, êsse outro "momento" está igualmente presente, em que a consciência revogou e reabsorveu essa alienação e objetividade e está, assim, em casa em seu outro ser como tal

Continua...

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