Eleição do moderado Rowhani no Irã complica guerra civil na Síria, onde EUA e al-Qaeda estão do mesmo lado
Por Roberto Cattani
Até agora, sob a presidência de Mahmoud Ahmadinejjad, o Irã era o principal suporte econômico e financeiro do regime de Bashar al-Assad, o grande aliado estratégico, e o maior fornecedor de armas, por intermediário do movimento xiita libanês Hezbollah.
A eleição, para a presidência iraniana, do aiatolá Hassan Rowhani pode reverter esse cenário: apoiado pelo movimento progressista, Rowhani é um moderado pragmático e experiente, que pretende melhorar desde já as relações exteriores do Irã e tirá-lo do isolamento diplomático, para aliviar a pressão das sanções internacionais e melhorar a trágica situação econômica do país. Já deixou claro que quer se reaproximar dos Estados Unidos e até de Israel: para isso, terá que se distanciar abertamente do regime de Assad, e cortar o apoio financeiro e militar ao Hezbollah. Assad percebeu imediatamente o perigo, e já enviou para Teerã, no dia seguinte à eleição de Rowhani, uma delegação de alto nível para “reafirmar os laços entre os dois países”, mas os representantes sírios foram recebidos friamente no meio dos festejos da vitória eleitoral.
O secretário geral do Hezbollah, Hassan Nasrallah, cujo irmão morreu nos combates na Síria, afirmou em maio passado que a “revolta popular” é, na verdade, uma guerra declarada pelos islamistas e apoiada pelos países árabes, Estados Unidos e Israel contra o “Eixo de Resistência [do xiismo]” formado pelo regime sírio, o Irã e o Hezbollah. Insistindo que, depois da Síria, será a vez do Líbano e da Palestina.
Sem o suporte direto do Irã, restaria para o regime de Assad a aliança passiva da Rússia, que fornece às forças armadas sírias armamentos pesados avançados, como os mísseis terra-ar S-300 chegados em Damasco a semana passada. O apoio remonta aos tempos da União Soviética, quando presidente sírio era o pai de Bashar, Hafez al-Assad. E uma vaga “solidariedade” diplomática da China e da Venezuela nas instâncias internacionais. É só.
O exército sírio é poderoso, bem armado e treinado, mas sem o Hezbollah teria como único apoio as milícias paramilitares Chabiha, do partido Ba’ath de Assad, e os poucos cristãos sírios dispostos a lutar para sustentar o governo atual. É pouco, diante da formidável coalizão que quer se livrar do oftalmologista-presidente Bashar al-Assad.
A coalizão inclui a Liga Árabe, a Arábia Saudita, a Turquia, os autonomistas curdos, o movimento fundamentalista sunita Hamas, Israel, os Estados Unidos, a França e a Inglaterra, assim como al-Qaeda e os movimentos jihadistas (1) e salafitas (2) locais (al-Nusra) e internacionais (Fatah al-Islam, Ghuraba al-Sham e a brigada al-Faruq). É claro que a único objetivo que esse balaio de gatos tem em comum é o fim do regime Assad. Do resto, cada um deles tem propósitos e planos diferentes, e na maioria dos casos até opostos e contraditórios.
Vamos examinar caso por caso, para chegar a um panorama mais claro da complexidade da situação atual e de suas possíveis evoluções. Começamos pelo elemento mais explosivo, al-Qaeda e os jihadistas. Desde a época da luta dos mujahiddin afegãos contra o exército soviético, foi surgindo e se consolidando uma verdadeira ‘Internacional Salafita’, que há mais de vinte anos se desloca pelo cenário internacional, onde houver a possibilidade de lutar para um regime islamista extremista. Depois do Afeganistão, os guerrilheiros jihadistas (recrutados em todo o mundo islâmico), com al-Qaeda como liderança ideológica, e os mercenários que o movimento contrata (sobre esse aspecto, recomendamos o maravilhoso livro de Nicolai Linin, ‘Queda Livre’, sobre a guerra na Chechênia) intervieram na Chechênia, no Sudão, no Iêmen, na Somália e especialmente na Líbia. Agora, eles constituem a ponta de lança do Cnfor (o Exército de liberação da Síria) e, se vencerem a guerra, tentarão impor um regime salafita. Em várias cidades ‘liberadas’, onde as tropas de Assad foram derrotadas e se retiraram (como Dara’a, onde começou em 2011 a revolta popular contra Assad), os jihadistas já implementaram com todo rigor as regras de conduta fundamentalistas.
O Hamas, o movimento sunita libanês, confirmando o ponto de vista do Hezbollah, vê nessa guerra uma ‘extensão da luta no Líbano’ entre xiitas e sunitas, e na eleição de Rowhani vislumbra agora a ocasião para tentar reduzir a influência e o poderio do rival Hezbollah no Líbano e na Palestina.
A Arábia Saudita e a Liga Árabe querem se livrar do regime de Assad, por ser o único governo ainda nas mãos do partido Ba’ath (socialista e laico, de herança nasseriana, como era também – pelo menos em teoria – Saddam Hussein); e do próprio Assad, por ele pertencer à seita alauita, considerada pelo islamismo sunita uma seita herética xiita.
A Turquia, que tem centenas de quilômetros de fronteira com a Síria, mantinha um relacionamento muito tenso com Assad, principalmente por causa dos independentistas curdos. Para se poupar das reivindicações do PKK e do Conselho nacional curdo, Assad permitia que os guerrilheiros curdos operassem contra a Turquia a partir dos territórios fronteiriços sírios, na região entre Ayn al-Arab e Qamishli.
Os curdos, por sua parte, vêem agora, na queda do regime assadiano, a possibilidade de conquistar finalmente uma pátria curda, ou pelo menos um território autônomo, dentro da Síria do futuro. O que os outros membros da coalizão irão impedir, como já muitas vezes no passado, até com a repressão armada.
Israel nos últimos anos sempre esteve à beira da guerra com a Síria por causa do Golã, mas desde 2011 Assad tem preocupações mais graves e urgentes do que recuperar os territórios sírios ocupados pelo Estado judaico, e não tem nenhum interesse em abrir outro front de guerra contra o inimigo mais poderoso da região. A aviação israelense bombardeou ocasionalmente comboios do Hezbollah em território sírio, quando representavam uma ameaça séria para a segurança de Israel, como no caso do transporte de mísseis de longo alcance de fabricação iraniana. Mas o governo de Benjamin Netanyahu prefere esperar e não intervir diretamente no conflito, pelo menos de forma explícita (seus serviços secretos devem estar onipresentes na Síria, em busca de informações para intervenções ‘cirúrgicas’ discretas, como é no estilo deles).
Resta o “mistério” do Ocidente em geral, e a confusão dos EUA em especial, que parecem querer repetir, tais quais, os erros cometidos de recente na Líbia, onde a intervenção armada ocidental contra Gadafi deixou espaço para o poder dos grupos jihadistas, e abriu o caminho o vácuo de poder atual. Os Estados Unidos justificam sua possível intervenção na Síria (como sempre) com o argumento moral (o uso das armas químicas e do gás Sarin pelo malvado Assad contra a população), enquanto os países europeus se justificam (como sempre) com o argumento da vontade popular e da liberdade de escolha do povo (foi o povo que se revoltou contra a ditadura). Nem os EUA nem as democracias europeias parecem se dar conta, ou acreditar de verdade que a queda de Assad abriria o caminho para um caos talvez pior, com lutas intestinas entre as partes “vencedoras” e a possibilidade de um regime fundamentalista, muito mais anti-ocidental do que Assad (cuja lindíssima mulher Asma, aliás, nasceu em Londres de pais sírios, e se criou na alta sociedade inglesa).
E não será por falta de informação, já que há dezenas de agentes da CIA na Jordânia (outro país de fronteira com a Síria) dando apoio (logístico, por enquanto) ao Exército de liberação sírio e, portanto, aos próprios jihadistas.
Nos últimos dias, Barack Obama pareceu se decidir, depois de muita hesitação, a fornecer armas aos rebeldes, como primeiro passo para uma intervenção direta dos EUA. Vale lembrar o que aconteceu no Afeganistão na décadas de 80, quando o governo de Ronald Reagan conseguiu a aprovação do Senado de Washington para fornecer os formidáveis mísseis portáteis Stinger aos mujahiddin, que com eles acabaram com os helicópteros soviéticos, para depois, nas mãos dos Taleban, usá-los contra os próprios americanos. É exatamente o que os rebeldes sírios estão pedindo: não as armas leves que os americanos oferecem (preferem os bons e velhos Kalashnikov), mas sistemas anti-tanques e anti-helicópteros de última geração. Será que a história irá se repetir?
Por outro lado, a Rússia está tentada a endurecer sua oposição – como não fez com a Líbia, mas parece decidida a fazer, no caso de um aliado histórico como a Síria da dinastia Assad. Até para recuperar sua posição de peso diplomático em alternativa ao Ocidente, depois de anos de eclipse quase total no cenário internacional. Putin pode aproveitar-se da incerteza norte-americana diante da aleatoriedade da situação síria, para esboçar um confronto renovado com os Estados Unidos, de igual para igual, evidentemente não no campo de batalha, mas através do apoio aos ‘inimigos de seu inimigo’, como nos tempos da Guerra Fria e da guerra do Vietnã.
A própria população síria, que detonou a revolta de forma espontânea e autônoma, e participa ativamente à luta há mais de dois anos, está cada vez mais envolvida num jogo de ideologias e jogos políticos no qual parece pouco importar o seu destino, suas diversidades e suas escolhas específicas. Não se pode esquecer que a Síria carrega uma história e uma civilização das mais ricas e complexas, e os sírios são um dos povos mais educados do mundo árabe.
Com o engajamento direto do Irã durante a presidência de Ahmadinejjad a favor do regime de Assad, o êxito da guerra civil era bastante incerto, e Assad parecia capaz de resistir à ofensiva rebelde, e até reverter as derrotas iniciais. Se realmente o presidente eleito iraniano for retirar o apoio ao vizinho periclitante, é só uma questão de tempo para Assad seguir o mesmo destino trágico de Saddam Hussein e Gadafi.
Mas o que virá depois é uma incógnita bastante inquietante, num país rico em petróleo, e estrategicamente colocado bem no centro do Oriente Médio.
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1. Jihad é um conceito essencial da religião islâmica e significa “empenho”, “esforço”. Aquele que segue a Jihad é conhecido como Mujahid.
2. O salafismo (do árabe salafī, “predecessores” ou “primeiras gerações”) é um movimento reformista islâmico que surgiu no Egipto no final do século XIX dentro do que podemos referir como período de renascimento cultural árabe.
Por Roberto Cattani
Até agora, sob a presidência de Mahmoud Ahmadinejjad, o Irã era o principal suporte econômico e financeiro do regime de Bashar al-Assad, o grande aliado estratégico, e o maior fornecedor de armas, por intermediário do movimento xiita libanês Hezbollah.
A eleição, para a presidência iraniana, do aiatolá Hassan Rowhani pode reverter esse cenário: apoiado pelo movimento progressista, Rowhani é um moderado pragmático e experiente, que pretende melhorar desde já as relações exteriores do Irã e tirá-lo do isolamento diplomático, para aliviar a pressão das sanções internacionais e melhorar a trágica situação econômica do país. Já deixou claro que quer se reaproximar dos Estados Unidos e até de Israel: para isso, terá que se distanciar abertamente do regime de Assad, e cortar o apoio financeiro e militar ao Hezbollah. Assad percebeu imediatamente o perigo, e já enviou para Teerã, no dia seguinte à eleição de Rowhani, uma delegação de alto nível para “reafirmar os laços entre os dois países”, mas os representantes sírios foram recebidos friamente no meio dos festejos da vitória eleitoral.
O secretário geral do Hezbollah, Hassan Nasrallah, cujo irmão morreu nos combates na Síria, afirmou em maio passado que a “revolta popular” é, na verdade, uma guerra declarada pelos islamistas e apoiada pelos países árabes, Estados Unidos e Israel contra o “Eixo de Resistência [do xiismo]” formado pelo regime sírio, o Irã e o Hezbollah. Insistindo que, depois da Síria, será a vez do Líbano e da Palestina.
Sem o suporte direto do Irã, restaria para o regime de Assad a aliança passiva da Rússia, que fornece às forças armadas sírias armamentos pesados avançados, como os mísseis terra-ar S-300 chegados em Damasco a semana passada. O apoio remonta aos tempos da União Soviética, quando presidente sírio era o pai de Bashar, Hafez al-Assad. E uma vaga “solidariedade” diplomática da China e da Venezuela nas instâncias internacionais. É só.
O exército sírio é poderoso, bem armado e treinado, mas sem o Hezbollah teria como único apoio as milícias paramilitares Chabiha, do partido Ba’ath de Assad, e os poucos cristãos sírios dispostos a lutar para sustentar o governo atual. É pouco, diante da formidável coalizão que quer se livrar do oftalmologista-presidente Bashar al-Assad.
A coalizão inclui a Liga Árabe, a Arábia Saudita, a Turquia, os autonomistas curdos, o movimento fundamentalista sunita Hamas, Israel, os Estados Unidos, a França e a Inglaterra, assim como al-Qaeda e os movimentos jihadistas (1) e salafitas (2) locais (al-Nusra) e internacionais (Fatah al-Islam, Ghuraba al-Sham e a brigada al-Faruq). É claro que a único objetivo que esse balaio de gatos tem em comum é o fim do regime Assad. Do resto, cada um deles tem propósitos e planos diferentes, e na maioria dos casos até opostos e contraditórios.
Vamos examinar caso por caso, para chegar a um panorama mais claro da complexidade da situação atual e de suas possíveis evoluções. Começamos pelo elemento mais explosivo, al-Qaeda e os jihadistas. Desde a época da luta dos mujahiddin afegãos contra o exército soviético, foi surgindo e se consolidando uma verdadeira ‘Internacional Salafita’, que há mais de vinte anos se desloca pelo cenário internacional, onde houver a possibilidade de lutar para um regime islamista extremista. Depois do Afeganistão, os guerrilheiros jihadistas (recrutados em todo o mundo islâmico), com al-Qaeda como liderança ideológica, e os mercenários que o movimento contrata (sobre esse aspecto, recomendamos o maravilhoso livro de Nicolai Linin, ‘Queda Livre’, sobre a guerra na Chechênia) intervieram na Chechênia, no Sudão, no Iêmen, na Somália e especialmente na Líbia. Agora, eles constituem a ponta de lança do Cnfor (o Exército de liberação da Síria) e, se vencerem a guerra, tentarão impor um regime salafita. Em várias cidades ‘liberadas’, onde as tropas de Assad foram derrotadas e se retiraram (como Dara’a, onde começou em 2011 a revolta popular contra Assad), os jihadistas já implementaram com todo rigor as regras de conduta fundamentalistas.
O Hamas, o movimento sunita libanês, confirmando o ponto de vista do Hezbollah, vê nessa guerra uma ‘extensão da luta no Líbano’ entre xiitas e sunitas, e na eleição de Rowhani vislumbra agora a ocasião para tentar reduzir a influência e o poderio do rival Hezbollah no Líbano e na Palestina.
A Arábia Saudita e a Liga Árabe querem se livrar do regime de Assad, por ser o único governo ainda nas mãos do partido Ba’ath (socialista e laico, de herança nasseriana, como era também – pelo menos em teoria – Saddam Hussein); e do próprio Assad, por ele pertencer à seita alauita, considerada pelo islamismo sunita uma seita herética xiita.
A Turquia, que tem centenas de quilômetros de fronteira com a Síria, mantinha um relacionamento muito tenso com Assad, principalmente por causa dos independentistas curdos. Para se poupar das reivindicações do PKK e do Conselho nacional curdo, Assad permitia que os guerrilheiros curdos operassem contra a Turquia a partir dos territórios fronteiriços sírios, na região entre Ayn al-Arab e Qamishli.
Os curdos, por sua parte, vêem agora, na queda do regime assadiano, a possibilidade de conquistar finalmente uma pátria curda, ou pelo menos um território autônomo, dentro da Síria do futuro. O que os outros membros da coalizão irão impedir, como já muitas vezes no passado, até com a repressão armada.
Israel nos últimos anos sempre esteve à beira da guerra com a Síria por causa do Golã, mas desde 2011 Assad tem preocupações mais graves e urgentes do que recuperar os territórios sírios ocupados pelo Estado judaico, e não tem nenhum interesse em abrir outro front de guerra contra o inimigo mais poderoso da região. A aviação israelense bombardeou ocasionalmente comboios do Hezbollah em território sírio, quando representavam uma ameaça séria para a segurança de Israel, como no caso do transporte de mísseis de longo alcance de fabricação iraniana. Mas o governo de Benjamin Netanyahu prefere esperar e não intervir diretamente no conflito, pelo menos de forma explícita (seus serviços secretos devem estar onipresentes na Síria, em busca de informações para intervenções ‘cirúrgicas’ discretas, como é no estilo deles).
Resta o “mistério” do Ocidente em geral, e a confusão dos EUA em especial, que parecem querer repetir, tais quais, os erros cometidos de recente na Líbia, onde a intervenção armada ocidental contra Gadafi deixou espaço para o poder dos grupos jihadistas, e abriu o caminho o vácuo de poder atual. Os Estados Unidos justificam sua possível intervenção na Síria (como sempre) com o argumento moral (o uso das armas químicas e do gás Sarin pelo malvado Assad contra a população), enquanto os países europeus se justificam (como sempre) com o argumento da vontade popular e da liberdade de escolha do povo (foi o povo que se revoltou contra a ditadura). Nem os EUA nem as democracias europeias parecem se dar conta, ou acreditar de verdade que a queda de Assad abriria o caminho para um caos talvez pior, com lutas intestinas entre as partes “vencedoras” e a possibilidade de um regime fundamentalista, muito mais anti-ocidental do que Assad (cuja lindíssima mulher Asma, aliás, nasceu em Londres de pais sírios, e se criou na alta sociedade inglesa).
E não será por falta de informação, já que há dezenas de agentes da CIA na Jordânia (outro país de fronteira com a Síria) dando apoio (logístico, por enquanto) ao Exército de liberação sírio e, portanto, aos próprios jihadistas.
Nos últimos dias, Barack Obama pareceu se decidir, depois de muita hesitação, a fornecer armas aos rebeldes, como primeiro passo para uma intervenção direta dos EUA. Vale lembrar o que aconteceu no Afeganistão na décadas de 80, quando o governo de Ronald Reagan conseguiu a aprovação do Senado de Washington para fornecer os formidáveis mísseis portáteis Stinger aos mujahiddin, que com eles acabaram com os helicópteros soviéticos, para depois, nas mãos dos Taleban, usá-los contra os próprios americanos. É exatamente o que os rebeldes sírios estão pedindo: não as armas leves que os americanos oferecem (preferem os bons e velhos Kalashnikov), mas sistemas anti-tanques e anti-helicópteros de última geração. Será que a história irá se repetir?
Por outro lado, a Rússia está tentada a endurecer sua oposição – como não fez com a Líbia, mas parece decidida a fazer, no caso de um aliado histórico como a Síria da dinastia Assad. Até para recuperar sua posição de peso diplomático em alternativa ao Ocidente, depois de anos de eclipse quase total no cenário internacional. Putin pode aproveitar-se da incerteza norte-americana diante da aleatoriedade da situação síria, para esboçar um confronto renovado com os Estados Unidos, de igual para igual, evidentemente não no campo de batalha, mas através do apoio aos ‘inimigos de seu inimigo’, como nos tempos da Guerra Fria e da guerra do Vietnã.
A própria população síria, que detonou a revolta de forma espontânea e autônoma, e participa ativamente à luta há mais de dois anos, está cada vez mais envolvida num jogo de ideologias e jogos políticos no qual parece pouco importar o seu destino, suas diversidades e suas escolhas específicas. Não se pode esquecer que a Síria carrega uma história e uma civilização das mais ricas e complexas, e os sírios são um dos povos mais educados do mundo árabe.
Com o engajamento direto do Irã durante a presidência de Ahmadinejjad a favor do regime de Assad, o êxito da guerra civil era bastante incerto, e Assad parecia capaz de resistir à ofensiva rebelde, e até reverter as derrotas iniciais. Se realmente o presidente eleito iraniano for retirar o apoio ao vizinho periclitante, é só uma questão de tempo para Assad seguir o mesmo destino trágico de Saddam Hussein e Gadafi.
Mas o que virá depois é uma incógnita bastante inquietante, num país rico em petróleo, e estrategicamente colocado bem no centro do Oriente Médio.
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1. Jihad é um conceito essencial da religião islâmica e significa “empenho”, “esforço”. Aquele que segue a Jihad é conhecido como Mujahid.
2. O salafismo (do árabe salafī, “predecessores” ou “primeiras gerações”) é um movimento reformista islâmico que surgiu no Egipto no final do século XIX dentro do que podemos referir como período de renascimento cultural árabe.
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