Eduardo Galeano explica que golpes como os de Honduras e Paraguai ocorrem cada vez que há tentativas de mudar as coisas, porque mudanças são vistas como ameaças pelos donos da ordem estabelecida, que não querem que nada mude
O escritor uruguaio Eduardo Galeano, autor de “As veias abertas da
América Latina”, afirmou que o impeachment do ex-presidente paraguaio
Fernando Lugo foi um golpe de Estado muito mal disfarçado.
Para ele, até a sentença que declara Lugo culpado termina
evidenciando que não há provas, mas estas não são necessárias porque se
trata de domínio público.
Em entrevista à revista La Garganta Poderosa, Galeano ressaltou que o
Paraguai foi arrasado por crimes de independência por ser o único país
de fato livre, de fato independente, que não nasceu da dívida externa
como nasceram outros países da América Latina. “Paraguai tinha uma
organização interna do trabalho e dos direitos dos trabalhadores, que
era inviável para o resto dos latino-americanos”.
No Paraguai, “não havia fome, nem analfabetismo e o que havia era um
sentido de dignidade nacional. Depois da derrota, quando a Tríplice
Aliança arrasou o país, perderam isso (…) os poucos sobreviventes do
extermínio do Paraguai receberam o país mais heroico de todos. E os
invasores (…) desenvolveram uma enorme dívida com os banqueiros que
financiaram o extermínio”.
Sobre o porquê do acontecido no Paraguai agora, ele esclarece:
“porque houve um governo que quis recuperar essa tradição de dignidade,
que como dissemos, não estava morta. (…) Então Lugo tentou, muito
timidamente, iniciar algumas mudanças para que o Paraguai voltasse a ser
o país mais independente de todos, o mais justo, e isso foi um pecado
imperdoável, do ponto de vista dos donos do poder”.
Na comparação entre o golpe no Paraguai e o ocorrido em Honduras em
2009, o escritor reclarou que “simplesmente ocorre algo similar cada vez
que há tentativas de mudar as coisas, porque isso se vive como uma
ameaça sob o enfoque dos donos da ordem estabelecida, que não querem que
nada mude. Eles vêem como um perigo, uma ameaça, ainda que na realidade
não fosse um perigo grave, porque nem em Honduras, nem no Paraguai
havia presidentes envolvidos em revoluções muito profundas. Apenas
anunciaram que começavam a fazer, ou que tinham a intenção de fazer
alguma reforma. Se isso bastou para derrubá-los, o que quer dizer é que é
um veto, que suponho que vem de cima, que está para além dos governos,
ou que há quem governe esses governos , governados do exterior e de
cima. Os golpes vão se incubando aos poucos e com o apoio dos meios
dominantes de comunicação”, afirmou Galeano.
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