Por: Wálter Maierovitch
Nos bancos das faculdades de Direito ensina-se que a democracia é um sistema e um regime político “no qual o povo comanda”.
A nossa Constituição é democrática. E o povo escolhe, por eleições livres, os seus representantes no Parlamento.
Assim sendo, os representantes do povo, reunidos em comissão
parlamentar mista investigatória, detêm poderes legítimos para convocar o
procurador-geral da República, governadores, ministros, presidente da
República, Cachoeira, Demóstenes etc.
Para os representantes da Magna Grécia, como por exemplo o senador
Álvaro Dias (PSDB-PR), o procurador-geral da República, Roberto Gurgel,
não está obrigado, por lei e pela Constituição, a atender convocação da
Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que está em curso. Dias não
esclarece qual seria a lei e, quanto à Constituição, parece ter lido mas
não compreendido o seu teor.
Em resumo, Gurgel pode recursar convite para comparecer à CPI, como
qualquer cidadão brasileiro pode fazer. Mas, Gurgel, por ser um Brasil
uma democracia representativa, não pode, sob pena de crime de
desobediência e impeachment, deixar de atender a uma convocação do povo, por seus representantes reunidos numa CPI.
Com efeito. O procurador-geral Roberto Gurgel entendeu em não aceitar
o convite para prestar esclarecimentos aos membros da Comissão
Parlamentar de Inquérito que apuram o chamado “Escândalo Cachoeira”.
Ao declinar do convite, Gurgel disse que não pode atuar como titular
da ação penal e como uma espécie de testemunha na CPI ao mesmo tempo.
Logo depois, disse à mídia que segurou o inquérito Vegas para aguardar
as apurações que estavam em curso, numa referência à Operação Monte
Carlo.
Desde logo, frise-se, Gurgel não seria chamado para testemunhar, mas
para explicar uma desídia, com violação ao determinado no vigente Código
de Processo Penal, ou seja, o fato de ter, desde 2009 e a descumprir
prazo legal para devolução com pronunciamento, colocado no freezer os
autos de inquérito policial sobre a chamada Operação Vegas.
Nos Estados de Direito, os poderes são independentes e existe, entre
eles, além da harmonia, um sistema de freios e contrapesos. Por isso,
existe o dever de fiscalizações recíprocas. Isso obriga Gurgel, como
chefe do Ministério Público, a prestar esclarecimentos a uma comissão
parlamentar. Aliás, uma comissão mista voltada a apurar crimes graves
como, por exemplo, corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de
influência, licitações forjadas.
Da mesma forma que Gurgel, os chefes dos executivos estaduais, os
governadores de Goiás, Distrito Federal e Rio de Janeiro, têm, como já
frisado acima e agora é repetido, o dever de atender às convocações da
CPI instaurada. Apenas teriam motivos para não comparecer, no caso, os
ministros do Supremo Tribunal Federal em condições de julgar futuras
ações penais contra Demóstenes, Cachoeira et caterva.
Além disso, depois de atender à convocação da CPI, o
procurador-geral, caso se sinta impedido, poderá deixar o caso Cachoeira
para seu substituto legal.
Como regra, portanto, ninguém pode deixar de atender à convocação de
uma CPI. Assim sendo, Gurgel poderá, ainda e por haver declinado do
convite formulado, ser convocado. Terá o dever de comparecer, salvo se
obtiver liminar de dispensa do Supremo Tribunal Federal: Gilmar Mendes e
Joaquim Barbosa estarão impedidos por terem adiantado suas teses fora
dos autos, ou seja, intempestivamente.
2. Depois da canhestra explicação dada para declinar do convite
formulado pela CPI, o procurador-geral da República resolveu apelar para
o diversionismo sem a coragem de dar nomes. E para um acusador de
ofício pega muito mal omitir nomes. Fosse em juízo, sua denúncia seria
inepta. A propósito, Gurgel disse estar está sendo criticado por pessoas
que “estão morrendo de medo do Mensalão”.
Gurgel deve explicações aos cidadãos brasileiros e aos parlamentares
que o representam. Em outras palavras, deve esclarecimentos à CPI sobre
ter transformado o seu gabinete de trabalho em freezer para congelar e
não dar andamento, ou solução, a inquérito policial.
O procurador-geral, frise-se mais uma vez, disse que segurou o
inquérito Vegas para aguardar as apurações que estavam em curso, numa
referência à Operação Monte Carlo. Ao se explicar, fingiu Gurgel
esquecer que o inquérito Vegas estava terminado em 2009 e a Monte Carlo é
recentíssima. Nem se cogitava a Monte Carlo quando a Vegas já estava
concluída.
Fora isso, diz a lei processual penal que o representante do
Ministério Público, ao receber o inquérito, deve, dentro de 30 dias no
caso de indiciado solto, denunciar (propor a ação penal), requerer
diligências ou solicitar o arquivamento do inquérito.
Nada disso fez Gurgel. Ou melhor, colocou no freezer o inquérito.
Talvez por possuir bola de cristal e enxergar que, passados alguns anos,
aconteceria a Operação Monte Carlo.
3. Não se deve esquecer, ainda, ter o delegado de polícia responsável
pelo inquérito decorrente da Operação Vegas, Raul Alexandre Marques de
Souza, contado, na primeira sessão da CPI, haver Gurgel incumbido a sua
esposa, a subprocuradora Cláudia Sampaio, de transmitir, isso em 2009, a
inexistência de indícios do envolvimento do senador Demóstenes Torres.
Ora, pela lei processual penal, Gurgel deveria, no mesmo ano, ter
pedido novas diligências ou o arquivamento do inquérito. Não fez isso e,
de quebra, teve o voto de Demóstenes, que antes o atacava, na sabatina
para sua recondução ao cargo de procurador-geral.
4. Pano rápido. A conduta de Gurgel é de tentar fugir da CPI. Gurgel
age como se estivesse com medo de não saber se explicar à sociedade
civil. E o Partido dos Trabalhadores, que também conta com
representantes da Magna Grécia como se afere pelo teor das manifestações
de um Cândido Vacarezza (SP), erra, como acaba de ser noticiado, ao
desistir de convocar Gurgel. No fundo, ambos se merecem.
Fonte: CartaCapital
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