Novos dados revelam: em todo o mundo, nunca as grandes corporações e milionários pagaram tão poucos impostos
Por Inês Castilho
O escândalo da sonegação
de impostos pela Rede Globo está chamando atenção da opinião pública –
talvez por incluir cenas de novela mexicana. Pastas repletas de
documentos comprometedores contra a emissora foram surrupiadas, numa
bolsa, por uma funcionária da Receita Federal. Rumores sugerem que
auditores fiscais foram eliminados fisicamente, por saberem demais (veja
mais a respeito em Outras Mídias).
Mas, embora menos parecido a lances de novelas, a redução constante da
contribuição financeira dos milionários e das grandes corporações para a
manutenção dos serviços públicos, é uma epidemia mundial.
No Brasil, os muito ricos
mantêm em paraísos fiscais, livres de impostos, a quarta maior quantia
do mundo depositada nesse tipo de conta bancária. Era de 520 bilhões de
dólares, mais de um trilhão de reais, em 2010, a “riqueza offshore não
registrada” para fins de tributação – como demonstrou o estudo The Price of Offshore Revisited,
encomendado pela Tax Justice Network a James Henry, ex-economista-chefe
da consultoria McKinsey. Em 2010, o PIB brasileiro somou cerca de 3,6
trilhões de reais.
John Christensen, diretor da Tax Justice Network – organização que combate os paraísos fiscais –, afirmou à BBC Brasil
que países exportadores de riquezas minerais seguem um mesmo padrão:
elites locais vêm há décadas sendo abordadas por bancos (Bank of
America, Goldman Sachs, JP Morgan, Citibank), principalmente
norte-americanos, para enviar recursos ao exterior. “Isso aumentou muito
nos anos 70, durante as ditaduras”, disse ele. Empresas dos setores
exportadores de mineração e petróleo e segmentos farmacêutico, de
comunicações e de transportes estão entre as que mais fazem uso dos
paraísos fiscais. “Quando vejo os ricos brasileiros reclamando de
impostos só posso crer que estejam blefando, porque eles remetem
dinheiro a paraísos fiscais há muito tempo” – disse Christensen.Apple, uma campeã?: Análise de registros fiscais do SEC (Securities and Exchange Commission) feita pela Pay Up Now (Pay Up Now analysis) revelou que o imposto de renda total (federal e estrangeiro) de 32 grandes empresas norte-americanas em 2012 foi de apenas 17% de suas receitas. O déficit em relação à taxa legal no país, de 35%, chega a cerca de 72 bilhões de dólares, quase o mesmo que o orçamento federal de ensino para 2013. Só a Apple sonegou mais do que o orçamento conjunto da National Science Foundation (Fundação Nacional da Ciência) e Small Business Administration (Administração da Pequena Empresa).
Outro artifício empregado
de modo recorrente é a chamada “lavagem de lucros”. Por meio de
operações contábeis, grandes grupos transnacionais “transferem” seus
ganhos para paraísos fiscais – onde estes não são tributados. Podem,
assim, declarar supostos prejuízos nas nações que aplicam impostos sobre
os lucros. O Bank of America, por exemplo, alegou ter sofrido, em
2011-12, perdas de 7 bilhões de dólares nos EUA, de onde vêm 82% de sua
receita. Contudo, registrou 10 bilhões de dólares em lucros, no
estrangeiro.
Logo atrás, o Citigroup afirma ter auferido 42% de suas receitas de
2011- 2012 na América do Norte (quase tudo nos EUA), com suposta perda
de 5 bilhões de dólares. No exterior, porém, teve lucro de 27 bilhões. A
Pfizer também: com 40% de suas receitas em 2011- 2012 nos EUA, teria
tido quase 7 bilhões de dólares em perdas por lá, ao lado de 31 bilhões
em lucros estrangeiros.
Intermináveis isenções fiscais:
Em 1953, início da era mais produtiva da história dos EUA, as
corporações arcavam com uma carga tributária correspondente a sua
capacidade econômica. Contribuíam com mais de um dólar para cada 33 centavos
pagos pelo trabalhador. Em 2011, elas eram incomparavelmente mais
ricas. Mas sua participação na garantia dos serviços públicos havia
despencado. Agora, para cada 33 centavos pagos pelos trabalhadores, elas
recolhiam apenas 7 centavos – catorze vezes menos que no pós-II Guerra…
As estimativas do valor movimentado pelo mercado de derivativos
financeiros variam entre 708 trilhões de dólares e 1,2 quatrilhão.
Embora esse dinheiro seja fruto de um mercado altamente especulativo e
improdutivo, do mundo da fantasia financeira, sobre ele incide zero de
impostos. Apenas uma pequena taxa é cobrada para cobrir as despesas do
órgão regulador do setor, a SEC (Securities and Exchange Commission).Daí a necessidade, mais que urgente, de corrigir essas distorções e implantar uma taxação sobre transações financeiras (TTF).
– * Com Paul Buchheit (professor de desigualdade econômica na De Paul University, em Chicago; fundador dos sites UsAgainstGreed.org, PayUpNow.orge RappingHistory.org), no Alternet
Fonte: OUTRAS PALAVRAS
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